quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Síncope, sinícope, sínica...

Quase queda dos passos, cansou-se de estar e passou a olhar os telhados, os gritos dos enforcados nos cantos dos quarteirões, não lamentou a alma vagando em si mesma, presa ao papelão torácico!

Os sapatinhos no alto engravatavam-se agradecidos, horas mortas à porta da frente da catedral. De luto, uma velha olhava com velas nos olhos a centopéiassaudade do dia dos seus mortos!

Amar? Amem. Amém!
A velha sorriu com uma palavra presa entre os dentes!
Ladainha branca dos ângelustelhados depenados entre as vigas!


Eduardo Martins

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

A M O R

Como se eu não estivesse aqui de fato. De repente sou flagrado por uma consciência surda-muda enquanto atravesso a calçada, enxugando o suor que escorre das têmporas com as costas da mão. Dias quentes. Alguns metros adiante o asfalto oscila diante de mim. A Terra vai morrer em breve e não sei como me proteger do futuro assustador. Lacrimejo sem querer - terá sido o vapor? A língua seca, uma outra gota de suor se formando na extensão de minha coluna vertebral. Sou tão biológico.

A planta é verde mas de tanta poeira observo que suas folhas estão pálidas. Poeira do mundo, migalhas de nossos grandes feitos. Humanidade velha. Qual a razão? Tem uma sombra adiante, vou cair nela e ficar deitado até que, como um metal super aquecido, possa me fundir ao chão. Cimento não, tampouco as coisas mortas. Vou passar direto pela sombra, é isso, decidi, vou passar direto pela sombra e provar do suor salgado saindo de dentro de mim. Mais uma lágrima.

Voo do pensamento acima das (poucas) nuvens no céu de hoje. Imensidão azul, como um mar que existisse sobre nós e somos os seres mais próximos do centro do planeta. Voo do pensamento para onde não haja motivo além da própria palavra motivo. Mar de motivo e eu. Mar de motivo para amar. Todas as cores girando em espiral, mentalize a espiral, todas as cores existentes girando sem fim na sua direção e a sensação de estar flutuando. Uma placenta: amor de mãe. Os olhos são pouco para aguentar a Beleza, é preciso doar a pele por esta causa.

É preciso doar a pele por esta causa e abraçar. O abraço como realização de toda vontade que ultrapassa os sentidos. O abraço como realização de toda vontade que ultrapassa a existência. Amor de graça. Fazer sombra pro coração um do outro nesses dias tão quentes que derretem toda matéria. Esquecer a matéria, abraçar com braços de soluço aquilo que não se vê. Abraçar com braços de soluço aquilo que está ali, não importa se vemos ou não.

Amor humano. Tremelicar os dedos no ar, tal qual criança descobrindo o oxigênio. Encontrar no ar outros dedos tremelicando, tocar estes dedos, descobrir junto com eles que o oxigênio nos une a todos através de uma necessidade. Descobrir no outro uma parte do oxigênio que lhe cabe, e saber roubar-lhe o ar docilmente. Num suspiro. Ar que falta, amor que sobra. Inspire profundamente, meu amor, e pense no que seria de você sem este ar que entra: eu sem você. Amor sexual. Todas as sensações divinas que se consegue por ser humano. Uma nova face da dedicação.

Olhos lacrimejando. O que é a gravidade que eu esqueci? Amor sem nome. Amor embrião. Descubro que estou lacrimejando pelo corpo todo e o calor já não é mais motivo, há uma diferença entre os pés no chão e o chão nos pés. Ou você racionaliza o que está composto ou a razão se compõe a partir de você, e no segundo caso todas as plantas empoeiradas têm o verde mais urgente da vida: urgência por existir. Voo do pensamento pro momento presente: amor permanente. Como se eu não estivesse aqui de fato. Em arco-íris.



B r a y a n C a r v a l h o

domingo, 15 de novembro de 2009

Ensaio Sobre a Gastronomia

Quando ela chegou em casa, viu o marido com outra. Ali, na sala mesmo. Sobre o sofá, de três lugares - sofá de tecido! Pensou que poderia bater nele por aquilo, mas não. O sofá era detalhe. O sofá era detalhe. Ela era detalhe. O casamento era detalhe. O sexo, também detalhe. Assim como o emprego era detalhe, a traição e a aliança na mesa de centro eram detalhes.

De tanto detalhe, a imagem se compôs. A esposa pegou o enorme vaso de cera e deu com ele na cabeça do marido, quebrou o vaso, fez o marido sangrar no topo da cabeça e viu-o cair desacordado. A outra levantou-se assustada com tanta violência. Foi no que a esposa, dos estilhaços do ex-vaso, precipitou-se sobre a outra e perfurou sua bacia. A mulher caiu, tentou levantar, caiu de novo e ficou: chorando.

A esposa atravessou a sala e foi a cozinha. Pegou a maior faca da gaveta e uma tábua de carnes. Foi cortar cebolas, na desculpa de chorar em paz.



Brayan Carvalho

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Notícia do dia 12/11/09

Engraçado. Engraçados, pra falar a verdade. O casal. Ela, pequenina, sentada assim como o marido, mal toca os pés no chão do trem. Mas cruzas as pernas finas de uma forma engraçada, é assim: ela as cruza normalmente, mas passa o pé da perna apoiada por detrás da perna de apoio. A (pouca) panturrilha é o que prende o pé ali. E o pé de apoio mal alcançando o chão, que engraçado. Chega a ser suave, de tão esforçado. O marido alcança sem problemas, confortavelmente. Joelhos afastados cerca de vinte centímetros um do outro, mãos entrelaçadas próximas ao sexo. De vez em quando, porém, as solta e coça, com a direita, o braço por debaixo da manga de sua camisa social completamente desabotoada. O tórax exposto revela sua idade: não tem menos de setenta anos.

Sua esposa idem. Percebe-se pelos braços, os tríceps cheios de dobras contra o seio. E é magra, a senhora. Mas idade é idade, baby. O buço escurecido por alguns pêlos está rendido, enrugado. Seus lábios são os mais finos que já vi. Mal abre a boca, exceto para bocejar, mostrando a língua incrivelmente ainda bastante rosada. Tem dentes. Pode ser dentadura, ok, mas os tem. Já o marido parece que não. Os lábios voltados para dentro são típicos de pessoas já sem seus dentes. Ele mantém sua boca entreaberta e ainda assim nada vejo. É um fosso, ou algo do tipo. A idade engoliu sua boca.

Ele de boné e barba por fazer; ela de brincos dourados e cabelos até os ombros, penteados para trás. Começam a conversar. Não sorriem, mas não estão brigando. É assunto de adultos. Devem estar juntos há um bom número de décadas, mas ainda permanecem atenciosos um com o outro. Ele a ouve falar com a boca aberta de criança de três meses de idade. Ela gesticula com as mãos trêmulas de idosa, aproximando-se do marido para facilitar o entendimento (o trem faz muito barulho movendo-se). Cessam a conversa de repente: ele olha ao redor incessantemente, mas numa calma absurda. Já viu de tudo, deve estar apenas procurando o que pode ter mudado. Ela fixa seu olhar num ponto qualquer do espaço e ali fica, como peixe dormindo. Mas está atenta, de uma forma tão sutil que só a experiência nos dá. Ele seca os lábios na manga da camisa, encarando a esposa que encara a paisagem, arrumando os cabelos como quem tivesse levado horas para armá-lo daquela forma.

Ele volta a entrelaçar as mãos entre as pernas. Não há pista alguma sobre seus nomes. Podem se chamar Zulmira e Adolfo ou mesmo Catarina e Jorge. De onde são? Pode ser tanto do Piauí quanto do Rio Grande do Sul, apesar de a esposa ter um tom de pele próximo ao de uma bala de caramelo. E Deus, como seu antebraço é fino! Só percebo isso agora, que ela ergueu um dos braços, segurando um dos ferros de apoio verticais do vagão. Ele nem tanto, é até bastante preenchido para alguém com sua idade. Idade de quem já teve de tudo, independente de ser rico ou pobre.

Permanecem calados. Falam bem pouco mesmo. Mas falar o quê? Para quê? Por quê? Nem escutando parecem que estão. Os olhos (de ambos, cansados) são o que estabelecem comunicação maior com o mundo. Eternamente marejados, os deles. Eternamente presentes. São avós, bisavós, quantos geraram? Para onde viajam? Que - pouquíssimos - assuntos são os seus? Ela fala a palavra "porta" junto a outras tantas irreconhecíveis. Só eles se entendem. Até que, prestando atenção numa conversa alheia sobre futebol, ele ri. Sem dentes mas não mostra a gengiva. Volta a ficar sério, desliga-se do assunto e volta a compor a mesma imagem inicial de ambos, o mesmo par de estátuas vivas & documento da vida em casal. As pernas dela cruzadas. Sua mãos sobre a coxa do marido. Ah, a cumplicidade!




Brayan Carvalho

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Espermo-poema

I

Porque a gente nunca sabe onde começa.
Assim vai, monta peça a peça e pensa:
"que merda é essa?", e se lança
pra ver se alcança o futuro no presente
ao passar pelo passado
mas cuidado!
Ele ainda não sabe como é ser
visto que mal chegou a nascer
e não se pode descobrir
se ele um dia será
ou se apenas seria.

Nasceu no meio da noite
pra se fazer valer ao meio-dia.

Ao mundo veio
com um sem-fim de veias
abertas pulsantes auto-suficientes,
um ser que é seio de seu ser
e veio como veio para se alimentar
do sentir, do saber - do próprio seio cear.

Bebe, se embriaga, fica leve
e o Diabo que o carregue
de mim,
que Deus já me rege.



II

Ponto. Ponto. Ponto. Ponto. Ponto.
Ponteiro........................................
O mundo inteiro despido
passa desapercebido
no corredor da maternidade;
e é carregado num colo feminino
que já faz meninos desde a mocidade;
e é nesse toque divino
com o que já foi tocado
que ele se percebe, matutino,
antecipando seu governo-estado-nação;
e são dois os leitos do rio
que devemos seguir sem feri-los;
e são dois os mamilos, os peitos,
vindos de uma mesma carne
- carneidoscópica -
que é córnea e que guia no sopro
que é córnea e que guia no sopro
que é córnea e que guia no sopro



III

Com o tato ele faz o contato.
No olfato percebe o fato.
Usa a visão para não
gastar sua fala
e na audição faz amarrá-la
à visa
de outro nome ainda escondido
mas que já se apresenta
tímido e contido:
com vida.

Como veio, está.
Um pouco fica mas logo muda
e comove
de como veio para como o ouvem,
que o louvem, o adorem,
que o carreguem no colo
por toda a praça do mundo
- os olhos do povo, Deus mais que profundo.



IV

Onomatopeizando
o mundo mundano
é que percebemos
o todo-engano,
o que perdemos.

Pois que perduraremos
como dissessem estar vivendo
em remendos de uma redoma de vidro,
pois que perduraremos
porque não somos os sonhos que teremos,
pois que perdoaremos
os equívocos, os mártires, os cristos
- e oremos, porque ainda somos pequenos.



V

Ouviu-se o primeiro batimento no berço
que ao bater se autoconstrói
passo a passo,
verso a verso,
sem nunca parecer que dói
o corpo tão frágil e terno
mas pronto a perder-se no mundo
da repetição,
das escrituras,
dos desalentos.



VI

Agora que o único é toda uma unidade
podemos dizer que úmida
é a data deste nascimento,
humilde ser sem qualquer vontade
à parte de todo acontecimento,
convertido da água pra insanidade
coagulada
coexistindo com o aborrecimento
- amamentando a chuva com poeira
como se o fizesse amiúde -
e humilhando-se ao levantar bandeira
de uma completa e sóbria infinitude.

Cadê suas faces para dar à tapa?
Nada se responde
em curiosa dor masoquista e anarquista,
não anda nesse bonde
porque não lhe compete
e antes que sua arte se mate
ele mira na testa do cervo
- atira e assegura a maldade
que motivo não há para ter medo
e esse é o seu segredo,
sua grade de ferro que isola
o mim do fora,
o futuro do agora.



VII

lá fora
agora
a hora travou
e o relógio caiu de podre
no chão coberto de aurora
agora
embora
não haja sucesso ou estrela
no céu repleto fora a fora
besteira
que porra



VIII

A noite é dos grilos:
melhor naão impedi-los.
Há sufoco na libertação
e não confunda, por Deus,
com libertinagem
ou falta de consideração
essa concha improvisada
que mar algum depositou
em caminhos mortais de homens mundanos.
Isto é prosa, é recurso, é caminho:
um bip e um chuá
embalados pra presente
em dia de domingo.
Devolve ao mar o mar numa garrafa,
deixa cair a madrugada
e sinta o fluxo dos sonhos em comunhão como se fosse a legítima força da natureza mesma que impressiona com resposta prática e apoteótica às perguntas que não são feitas mas estão pulsando sem explicação aparente para quem nunca alcançou o âmago de sua agonia enraizada como árvore centenária plantada no chão em que a noite nasce sempre inocente por causa do som da terra se expandindo como fosse o Universo observado e apenas por nós observado assim como o caminho desta solidão nostálgica foi encontrado através de um ai conjunto nascido ao mesmo tempo como um mantra na boca de todos na boca de todos na boca de todos na boca de todos na boca de todos na boca de:




Brayan Carvalho

domingo, 25 de outubro de 2009

Arquivos shakespeareanos secretos

De: Benvólio (benvolio@montecchio.com)
Enviada: sexta-feira, 25 de abril de 1591 18:47:52
Para: Romeu (romeu@montecchio.com)
Assunto: Rosalina! xD

-
fala aí romeu, vi a rosalina hoje de tarde e ela me disse que ta querendo ver se fala contigo sábado agora ^^ diz ela que os pais vão visitar uma tia fora de Verona e talvez só voltem no domingo de manhã, rs.

AEEEEEEE moleque! \o/ rsrsrsrs


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De: Romeu (romeu@montecchio.com)
Enviada: sexta-feira, 25 de abril de 1591 23:32:24
Para: Benvólio (benvolio@montecchio.com)
Assunto: RE: Rosalina!
-
mas cara, amanhã é festa dos capuleto lá... lembra que o mercúcio falou com a gente semana passada? se eu não for ele vai ficar cheio de gracinha pra cima de mim, tu sabe como ele é ¬¬ e a rosalina também é toda fresca, ela fica só instigando mas não dá em nada, é toda insegura... se tu ver ela até amanhã de noite fala pra ela que na~o vai dar, diz que eu to triste pra caramba por isso mas é que minha família só tem psicopata, huauhahuahua!

abraço, primo!


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De: Benvólio (benvolio@montecchio.com)
Enviada: domingo, 27 de abril de 1591 12:05:19
Para: Romeu (romeu@montecchio.com)
Assunto: Cadê tu, cara????

-
romeu, cara, que houve ontem que tu ficou lá nos capuletos até altas horas? tá maluco, véio, os caras são mó violentos e teu pai não ia gostar de saber que você fica indo na festa do grande inimigo dele... se dá merda lá e chega aos ouvidos do príncipe a coisa fica feia é pro teu pai! o mercúcio que é maluco, eu só ando com vocês ainda porque a gente é primo e eu considero o mercucio pra caramba e tal, porque pqp hein! --'

vê se me responde, seu doido!


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De: Romeu (romeu@montecchio.com)
Enviada: domingo, 27 de abril de 1591 15:40:02
Para: Benvólio (benvolio@montecchio.com)
Assunto: caaaaaaaaaaaara!!!11!

-
maluuuuco, cê não vai acreditar!! caraca primo, a filha do capuleto é muito gata! tipo, muito mesmo! a garota deve ter a minha idade, sei lá, e é muito simpática também! véio, a gente se beijou, tipo que rolou uma dança lá e ela saiu meio tonta pra beber alguma coisa, daí eu fui atrás (de máscara, claro) e cara, eu fiquei todo bobo perto dela, a menina é muito linda, toda perfeitinha, toda meiga, não aguentei, tive que beijar!!! só não deu pra ficar muito tempo lá porque a ama dela apareceu e tal, mas eu disfarcei numa boa, fingi que nem era comigo rsrsrsrs...

aí encontrei com vocês do lado de fora e tal, depois sumi de novo, lembra? tipo, eu escalei o muro da casa dela e falei com ela, olha que doideira que me deu, kkkkkkk, mas é que eu tinha que ir lá cara, eu precisava falar com ela direito, calmamente... benvólio, acho que gamei o.Õ e a merda é que é filha do capuleto, aí ferra tudo. mas ela é pra casar, de boa, nem que seja escondido!

aí, o nome dela é Julieta! bonito, né não? *.*
abração o/


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De: Benvólio (benvolio@montecchio.com)
Enviada: segunda-feira, 28 de abril de 1591 22:00:38
Para: Romeu (romeu@montecchio.com)
Assunto: RE: caaaaaaaaaaaara!!!11!

-
aí, namoral romeu, to sem palavras contigo ¬¬ continua com isso e cê ta morto, mano, tu e essa tua Julieta aí. quando a rosalina souber disso vai rir da tua desgraça e eu vou dar razão!

só faz merda hein, pelamor!!!!

sábado, 24 de outubro de 2009

Bomdia

Lara quem criou a palavra. E sem querer (ou querendo, vai saber) criou um novo mundo, como fosse fácil. Mas cá entre nós, deve ter sido, porque é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre pra chegar ao ponto de pronunciar tal palavra. Bomdia é a substituta de todas as máximas que abriram todos os portões para a humanidade, das artes às ciências passando pelas descobertas e invenções e reinvenções e bireinvenções de toda a civilização. Bomdia é palavra pra quem ama - o pai a mãe a família os amigos o amor da vida as coisas do mundo as coisas da vida. Caleidoscopicamente falando, assim mesmo.

Bomdia é um "BOOM!"dia, é palavra forte capaz de levar pessoas desavisadas às lágrimas, desacostumadas que todas estão a... É que não se olha mais para o lado, e bomdia é o giro trezentos e sessenta graus voluntário, sem intenções cinematrográficas - é documental, baby. Bomdia é escutar as pessoas enquanto se fala com elas, é distrubuir abraços em ouvidos sem pedir nada em troca. Bomdia é doação por excelência.

Sonho premonitório com final feliz: bomdia. Sonho de consumo dos sonhadores - realizadores em potencial. O amém dos populares, a boa nova dos lúcidos, a fibra dos laços que nos unem, a preliminar do gozo de existência, o recordista educado das competições educadas entre expressões de educação. Mas nunca redundante como essa última frase. Bomdia é da moda Primavera/Verão e da Outono/Inverno também, top de linha, uma belezura. Peça indispensável no vestuário espiritual.

À noite: bomdia. Bomdia vinte e quatro horas por dia: seu conselho é: pra te ver feliz. É a palavra que se diz ao fim da hipnose, quando o mesmerizado deve despertar, diz-se bomdia para o homem hipnotizado pelo cimento que não deseja nada; para a criança que está perdendo a infância; para os jovens fingindo aprender e aprendendo sem saber; para o tiozinho na praça com tanta história pra contar, tanta história que ninguém quer ouvir. E bomdia é a chance que se dá ao senhor, aos jovens, às crianças, ao homem da cidade. Todo mundo. Todo o mundo.

Bomdia é o pão de cada dia da felicidade.



Brayan Carvalho

domingo, 11 de outubro de 2009

dialética da formação

meia-noite
os olhos recurvos
os sonhos retintos
na sala apagada
_____de projeção
as vozes brincalhonas dos meninos
que fui
e que hoje tilintam
imemoriais metais
são solidão simplificada
figurinhas de ciranda
__________________ausentes
do meu álbum
debaixo
do meu primeiro casaquinho
na terceira de sete
gavetas
- de repente sei que não
não posso
justificar em alguma
_________travessura
do presente
o fato
de ter sido
________________esquecido
por mim mesmo.



Brayan Carvalho

sábado, 10 de outubro de 2009

Polifemo D.C.

I

Tão breve a brisa
tão longe o leste
tão forte a morte
tão muda a fonte
tão alto o monte
tão só, gigante,
tal nunca antes.

Teu olho cego
teu leigo medo
tua voz incerta
tua dor no peito
teu medo incauto
teu nome, aceito,
teus grandes feitos.

Teu sonho, um clone,
tão clap-clap
veloz galope
sem ter claquete
ou envelope
você, ciclope,
grande ciclone.


II

Em sua ilha à noite, derrotado,
qual sua verdade, una e tão sem calma,
se esconde, ridicularizado,
o ciclope, a quem ninguém bate palmas,
que já não basta, memória salva,
lembrares só, de um tempo tão errado
e remoto
pois se o mundo jaz morto
não voltas ao passado
nem será tão ingrato
se então ficares louco
e desmemoriado
no terremoto
dos outros corpos
catequizados
humanizados
pro teu engano
- teu desespero -
que, tão profano,
se revelou estéril de segredos
e trindades sagradas
sem heróis gregos
na
so
li
dão
não
ha
ve


III

(nada)




Brayan Carvalho

Sobre a Espera

Aqui. Reciclando qualquer segundinho daqueles nossos naqueles nossos momentos, requentando os cafés que só eu bebo, levando ao congelador e tirando do mesmo toda tarde os pães de queijo mordiscados na pontinha em tarde fria de domingo pela manhã: souvenirs. Nosso café da manhã. Nosso sofá de três lugares, dois corpos e uma única vontade. A foto no assento do ônibus, o dia nublado lá fora mas claro com raios pálidos de sol rasgando o cinza das nuvens na harmonia absurda da Natureza. Sua singeleza tímida, sua capacidade reflexiva límpida e enfeitada por alguns gramas de perplexidade. A síntese no sorriso, na ruga de canto de boca que ensaia perfomance algumas décadas mais tarde, o sucesso de uma piada infame fazendo escola nos seus músculos faciais e nas suas sinapses nervosas, suas mãos pequenas sendo levadas automaticamente ao rosto pra abafar o som da gargalhada que poderia incomodar o moço dormindo três assentos mais à frente àquela hora tão incomum.

Aqui. Sorvendo maresias distantes ao longo dos dias, comprando balas e as mordendo e as engolindo cheias de pedaços verdes azuis vermelhos quais as cores das balas que compro? Tomando bondes errados nas direções opostas. Mas bondes não existem, e concluo que vou só, que vou by myself. Saudade globalizada, mas ainda sem tradução. E o mundo é grande e não é redondo e caramba, estivemos juntos? Ou é isso a antecipação de uma semana que vem, de um mês que vem, de um ano que vem, de uma vida que vem? Dentro da vida mesma? Todo dia é uma solitária fotografia. E isso está ficando muito óbvio, mas é que esgotei a linguagem - não a do mundo, mas a minha neste momento. Falha humana, minha que sou humano. E morro por ela (colocar o nome aqui), morro de espera. Pera: para.

Lá. Mistério, meu coração, a ressonância de uma certeza discreta. De uma certeza que é reticência pro mundo, mas exclamação pra mim. E que por isso resume, faz ser bastante, torna suficiente todo e qualquer espaço em branco. Porque está além. Numa esfera transcendental, que vai nos levantar e vamos levitar e levitar e levitar até o tudo se tornar __________.


Brayan Carvalho

Microwave

Olho pra você e me sinto como quem não sabe de si. Há um quê de esquecimento quando estamos frente a frente, um descontentamento repentino. Estamos separados pela Física, eu na obviedade que é meu fado e minha brisa e não tenho tantos segredos. Você mascara, dissumula, você adiciona camadas diferentes a diferentes situações. Compram, usam, cuidam de você, todos tão acostumados, todos tão atuais. Seu amor é nocivo que faz bem. Sua história é de repente.

Chegamos ao ponto em que preciso de você. E como tocar, como sentir segurança em sua boca? Por onde devo deixar o dedo deslizar em seu corpo pra que eu me sinta satisfeito? E me sentirei assim, afinal?, já que não sei as razões que lhe movem? Posso me alimentar das coisas que você me oferece sem temer a enganação? Você é uma pergunta centenária e vive em minha casa, a 5 metros de minha cama - eu que sou tão resposta, todo afirmação, tanto sim - esquentando pães, milhos, batatas, águas, minha cabeça. Por que de repente preciso? Bah, que impreciso, isso.

Tudo tão de repente me faz repentinamente a onda refletida nesse romance viniciano pós-moderno no qual eu sou a garota correndo a caminho do mar e você é o sol. Que não está lá. Mas queima. E o mundo que gira é o prato sob meus pés, recebendo e repelindo, recebendo e repelindo, recebendo e repelindo. Que lindo. Que mágico. Um forno. Você. Eu. Pra onde olhar quando você avisa que terminou? Abro a porta, projeto a mão adiante e não sei o que você pode fazer com ela. Peço licença como quem se ajoelha frente a um crucifixo. Mas não tenho respeito; tenho medo.


Brayan Carvalho

domingo, 20 de setembro de 2009

Justi (ça) Fic(a/ativa(~)s

É que estas noites deixam meus olhos com ares de mar, com mares de ares marinheiros, perdidos inteiros neste sonhar de mares inteiros batendo a beira de mim, em beira de praia calada e cheia de sussurros destes fantasmas inseguros, tão próximos amantes do fim!

É que assim, de braços dados com eles, pego a braçadas as estradas mudas do mundo, em olhares fundos dos mares engolindo as estradas, os pecados de beira de rua, os segredos pescados das bocas deles para meus ouvidos: meus fantasmas, esquecidos, brotam tulipas azuis das bocas, flores que voam como moscas, que são palavras inaceitas, com gosto de sica, escorrendo feito agua de bica impune!

Aceito! Meu dedo aliançado com toda incerteza: uma grinalda de despesas despede-me das certezas vulgares que me afastam dos teus olhos, minha querida vida frívola! Prometo amar-te, não caber-te em sonetos, prometo porres perfeitos de belos luares de linho, com gosto de vinho derramado em mares...

Perco tudo - eu sou um arremedo quixotesco com dedos de pianista de teclas mudas- e não tenho nada mais que antes não tinha!: confesso-me, professo-me, prometo-me: sou de tal forma um arremedo que imito a mim mesmo para no fim, atirar a eso estes segredos de mim!

Lá fora sussurram umas verdades da boca dos outros, pelos quintais dos poucos homens que não tem nada mais do que têm de verdade: dialética poética da certeza! Por sobre a mesa, sirvo minha vida: prato frio sem requintes de ser quente!

Ainda me perco numa noite destas, ainda reconheço as brechas das gargantas dos meus fantasmas!!!


Eduardo Martins

sábado, 19 de setembro de 2009

Esmolas, minhas, esmolas...

À beira dos palcos umas luzes falam luxuosas como rainhas um linguajar muito arquétipo, um silêncio caótico, patético...Mas eu, muito longe, no muro alto na fronte do palco, sigo cego, ensurdeço as lâmpadas soltas pelas calçadas de gente passando esquecida de ser gente, detida, parada, rompida em beira de estrada de si, pedindo encarecida uma mão sobre a ferida de existir diferente das luzes coroadas, coronárias, abertas, sepulcárias...

Os sons secos saem sempre das bolsas soberbas, sem nada mais que um pouco: agradecimento prático de antes da chuva da tarde... Sorrio o gosto do pão quente e vazio entre os dentes, sentindo o sal do pão na calçada fria... Fim de dia, fim de tarde, eu uma pobre tempestade cancelada à luz do dia!

Alto de palco, máscara quebrada, mas de ouro, mais flores, ma(i)s nada: vitória compulsiva dos grandes artistas, rostos entre letras de revistas, rostos entre rostos das mulheres da platéia, aclamação ordinária das damas velhas, rolar pela boca das jovens línguas: declarações, aclamações: Salva de palmas, pelas ressalvas da máscara morta, salvem as palmas a artéria aorta dos palcos cegos, altos, sem ter tempestades...

Se me perguntam se eu tenho perdas, perdas não há quando haver não dá asas para tudo e embala em plumas as pobres brumas do nada...Quem leva as chuvas pelas as estradas são os ventos, são os ventos, são zéfiros detentos em antigas moradas...


Eduardo Martins

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Criacionismo

Deus criou o mundo em seis dias, depois olhou, cansou no sétimo, fingiu que era bom e bebeu um gole arquétipo do primeiro motivo vão: o homem, cidra da serpente! De repente, envenenado e incoerente, caiu arfante feito arcano gigante no chão serpenteando feito serpente em ano chinês!

Era o fim, era tarde, eram três horas da tarde e um Cristo covarde chorou ateu e são! São Cipriano, mago profano, abençoa este estigma de meu irmão de ciência, abençoa a indescência deste povo que, no mais, é irmão de Barrabás, é antraz das palavras, é sangue em estradas sagradas de Satanás (sangradas, além do mais, da coroa que faz chover a garoa de morrer sem pecados, sem humanos atos que te livrem de ser menos que mais)!

Vaga pela vela, fogo informe de Joana D'arc, doce arcanjo, faz crer que é uniforme o que na verdade te consome, mostra que a morte é obra-prima irmã do homem!

Eduardo Martins

domingo, 30 de agosto de 2009

Seis cachorros, três cadelas, trinta e dois feirantes e um menino chamado José

A cidade inteira chora um pouco:

Uma criança morta na rua da feira, perto de comida, já tinha um pão velho na mão quando assassinou-se! Verdades também são crianças de joelhos mortos!

A cidade inteira correu, como sempre, no sempre parado e os cachorros tiveram o que comer de verdade na rua da feira: sem bagaços, a carne era fresca e dura e magra, mas já tinha vermes!

Não houve quem reclamasse da mancha de sangue no chão: as pessoas souberam por uma vez que eram perecíveis e depois a memória pereceu velha: depois de correr para dentro de si mesma e assassinar-se!

Eduardo Martins

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Quantos...

Olhava para a mesa em uma certa dúvida de sempre: se sempre fosse assim um espaço plano, o nada seria a queda, mas se o nada fosse, não seria nada...Divagações, apontamentos inúteis, eram um bom passatempo ao menos. O importante é que pensava nela e só conseguia vê-la em nuances de versos, por detrás das rimas: estes tempos que passam sozinhos versam sempre uns bordados belos de palavras: para ele eram bordados desiguais e belos, vermelho sangue dos cabelos dela...

Dos cabelos não esquecia: pôr de sol sempre pondo em semfim de firmamento, como se fossem os olhos dela, os olhos dela assim: astro-i-lógicos em madrugada pele branca e morna!

Como queria que amanhecesse assim, aos poucos, em sua pele, que deitassem sobre ele aquelas brumas quentes e que aquela dúvida que ela tinha estivesse tombada no chão frio dos palcos: se toda a dúvida fosse mentira seria uma bela atuação sem cortes... Coragem dos heróis mascarados dos quadrinhos...Mas os heróis sempre morrem míticos e mudos como o h de presságio...

Ela já corria toda pelo seu sangue, redividia as veias, resfacelava a carne, tingia vermelho o sangue e as paredes dele com seu nome: mesmo quieta e calada reverberava-se em eco eterno! Como o mundo é vazio sem ela, como ecoa ela em todo vazio, enchendo tudo em enchurradas de março!

Quantos anos dormem em um dia sem ela? Quantos sonambulam burlando o sono? Quantos têm nanose de minutos?

A mesa continua toda e parada, pelos pés dela escorre um nada que pensei que enchesse tudo, já não é março, mas uma chuva afina a realidade...a tarde talvez não venha vermelha, mas fria! Ainda há um dia acabando-se em versos por ela e eu, por dentro, escorro todo em vermelho!



Eduardo Martins

Haicaix

roupa no varal
secando ao vento
e o sol soprando

________


morreu de fome
durante a guerra:
foi comer terra.

________


boneca morta
de olho aberto
- destino incerto


Brayan Carvalho

Ele gostava de mentir.

Desde sempre. Não lembrava sequer sua primeira vez, embora soubesse que nunca havia errado a mão nas mirabolâncias de suas histórias. É que nunca mentia apenas por prazer, mentia até mais por necessidade do que por simples aptidão. Se precisava escapar de uma encrenca ou garantir sua diversão arrumando um par para os bailes do colégio, aí mentia. Porque sua felicidade estava em jogo, mas ninguém entenderia o quão importante isto era para ele. E pela felicidade mentia; para a felicidade mentia.

Até que, homem feito já, recebeu no portão de sua casa um garotinho de pouca idade, talvez treze, talvez até menos. Pedia comida, um pão, um pacote de biscoitos, a sobra do almoço, o que fosse possível, na mais pura e singela educação, como se fosse experiente nessa prática. E era, reconheceu o nosso protagonista. Mas aquilo era inadmissível! Uma criança pedindo assim, tão desprotegida, e ainda por cima sem avisar a ninguém! Não estava pronto, decididamente, não era assim que as coisas funcionavam. Aquela cena desmontava toda a felicidade construída a muito custo durante todos aqueles anos. Felicidade de mentira.

Foi quando ele disse pro menino: olha, não tenho nada para lhe oferecer, nem sei porque você veio parar logo aqui neste portão, eu sequer existo, como posso te dar alguma coisa se nem sou de verdade?, entendeu?, então boa sorte e desculpa te desapontar.

Mal terminou de fechar o portão para o menino, o homem desapareceu. Assim, desapareceu, com todas as letras e todo o sumiço a que é digno de um desaparecimento. Desapareceu também sua casa, e junto com ela tudo o que havia dentro - tudo o que era fruto da mentira de anos.

Só o garotinho ainda continuava, de porta em porta em porta em porta.


Brayan Carvalho

Vampiro

Antes fosse. Pelo menos justificaria sua sede. Mas é que - perdoem-me as senhoras e os senhores, pensava ele - mas é que hoje acordei assim. Às três e trinta e três da manhã. Três e trinta e três, riu sozinho, parece coisa de médico quando vai auscultar o pulmão da gente. Levantou foi ao banheiro bebeu água abriu a janela do apartamento olhou pela janela do apartamento: a noite lá fora. Uma cidade que, ufa!, dorme. Depois de tantos anos, a paz finalmente. A paz que, frustrantironicamente, não queria agora.

Folheando a agenda de telefone encontrou-a. Espantado, vale a pena comentar. Pois que não lembrava de ter algum dia anotado sequer seu número, talvez porque não acreditasse revê-la um dia. Não um dia, mas quem sabe uma noite?, sorriu involuntariamente malicioso. Ligou, ligou mesmo, ignorando o três que três vezes tremia no ar. Atenderam. Era ela. Conversaram. Ela disse que sim. Ele disse que sim. Ela disse me espera. Ele disse claro. Desligaram. Cerca de quarenta minutos depois (pra ele foi como inspirar e expirar) tocaram a campainha. Ela, claro. Ele abriu a porta. Ela entrou. Ele fechou a porta. Silêncio.

Hoje acordei me sentindo meio vampiro, sabe?, disse ele rindo do fundo de suas olheiras. Sentia-se seguro na presença dela. Concluiu que havia feito a coisa certa: chamá-la. Colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha (cabelo vermelho vivo, fogo) ela confessou estar esperando pela ligação dele. Tudo indicava que estava tudo certo, arranjado. Faltava só um dos dois se inclinar um pouco para a frente e estava feito. A alma dele estaria salva.

Foi quando, de olhos cerrados, decidiu finalmente aproximar-se, rosto a rosto, lábio a lábio. Mas provavelmente calculou errado a dimensão de seu alvo, pois sentiu que beijava não a boca de sua visitante, mas aquela mecha vermelha de cabelo agora atrás da orelha. Da cor do inferno. E ouviu, muito de perto, o estalar de músculos em seu pescoço. Ficaria por demais desapontado consigo mesmo, não fosse o sono estar voltando bem naquele momento.

E dormiu profundamente, a cabeça sem vida no colo de sua amante.


Brayan Carvalho

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Cala!

Três horas sentado no sofá da sala com a confiança toda esvaindo quase rastejante pelo meu corpo...Uma moleza de sono, já...Fim das cobiças, por alguns instantes, desistência total de doente: logo, conformar-me como se eu mesmo assistisse toda esta incoerência incômoda como um cachorro morto em beira da rua...

Estive lírico e literário, amarrotando-me nas roupas que já não estão mais confortáveis, com o gosto estranho de menta que os chicletes me deixaram na boca: tudo um pequeno cativeiro... Estou cheirando menos ao perfume cítrico que mais parecia o sumo de laranja asiática. Estive e, estar sempre, causa uma coisa esquisita na gente, um confessional berrado a plenos pulmões de noite...

Já quero que ela não venha para poder desistir da certeza da resposta, tudo perdido, eu perdido e tudo... Resquícios de uma honra insólita de antigos cavalheiros: hoje não é mais nada hoje, até a saudade cala!

Eduardo Martins

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Pelos corredores...

Uma noite semi-nua nos seus cabelos pretos escorrendo pelo pescoço, embolando em minhas mãos o seu cheiro!

As pessoas passam, passam os livros, as horas presas nas páginas dos livros, as inspirações didáticas dos discursos gritam quase roucas de sempre entre as paredes, vazam pelas portas!

Nada mais existe e o que insiste talvez não seja nada quando o fim do toda estrada são seus olhos dizendo sim...


Eduardo Martins (Eu disse que escreveria, não disse?)

domingo, 23 de agosto de 2009

Poema ruidoso, pecaminoso e sem poética alguma...Desculpe- me Anna!

Não demora muito, calam-se todos:
Um mundo parado:
Anna pisa em páginas !

Minhas inspirações poéticas nos cabelos ruivos,
Meus lirismos, ai, meus lirismos!
Minha musa nova da velha escola!

Eu todo tremo:
Por inveja aos Modernistas,
Por ódio aos outros olhos,
Por causa do cheiro de Anna!

Não demora muito,
Meus olhos baixam!
Conformo-me!
Por mim mesmo, odeio poesias em dias de chuva!

Prefiro as prosas das gotas,
Calando as palavras dos outros,
Afogando os olhos de lágrimas,
Escorrendo pela alma de Anna!


Eduardo Martins

Breviedade

Na mesa da sala, os papéis amontoados: um pouco de literatura alquebrada, um pouco de caricatura errada, testemunhas fiscais de compras, um copo de café sobre umas notas sem sentido. Muito pouca coisa, muita coisa em papéis: o dia inteiro tinha o aroma ocre do café!

Eduardo Martins

Do nada...

Não pensava em nada enquanto andava pelas ruas da cidade cheias de gente, cheias de cães soltos e de carros cheios: eu era o único vazio no meio da rua, andava sempre cheio de nada!

Enquanto: as ruas corriam paradas de tempos em tempos e depois de algum tempo paravam para que corressem por elas os passos, os percalços dos tempos, os sapatos gastos de firmamento que Deus usava para pocurar um novo pasto!

Depois, :mais nada, : eu, :do nada não estava mais na rua!

Eduardo Martins

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Queda livre

Uma gota, depois outra, depois outra, depois outra
Outra antes de ser gota
outra apenas
Chuvarada na janela da sala

Eduardo Martins

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Dezoito horas

Menino correndo pela rua, engolindo um doce
A noite engoliu o menino inteiro

O menino sumido, a noite preta no alto do morro
A noite, de joelhos ralados da queda, acocorada no morro

O menino de joelhos ralados, com a noite na pele...

Eduardo Martins

ohlepsE

Parei no espelho
Parei
Não sou mais eu que era antes
Mas antes era eu!

Eduardo Martins

Luz

Um relógio marcava devagar o tempo: o tempo silencioso não admite cicatrizes: lá fora tudo corre impune.

Estendido sobre o mundo: o dia
Adia o tempo, não adianta, há dia por esta hora!

Gosto do cheiro do asfalto curtido pelo sol: ao som do sol agitam-se os pássaros, adiantam-se os pássaros fugindo do pôr do sol: ponho o sol no cais do porto: aportam-se os pássaros em dias de sol!

Eduardo Martins

Perderemos as Borboletas

Não demora muito, jaz defunto o corpo das borboletas!

Nos céus do mundo, tudo calado! No chão arrastam-se as lembranças de umdiassódevidainteira! Eram onomatopéias de luz caindo!

Servem ao solo as asas das borboletas agora: as de antes corriam pelo silêncio de ontem! Agora, não servem mais para nada!

Brayan Carvalho (que largou o rascunho bonito no Blog!)
Eduardo Martins (eu, metido, tasquei coisa minha no rascunho e inventei que era um texto a quatro mãos! Beijinhos para a Clari...)

Convite à Inexistência

Jaz na parede a flor. Branca, plástica, seu fino e rugoso caule contorcido e suspenso como que por uma ausência de gravidade naquele ponto específico. Jaz na poeira, a flor. Uma traça traça planos ao seu redor. Quer casa, ainda que temporária. A algumas pétalas de distância, uma aranha já deu forma a um hexágono impreciso, rede improvisada para turistas desavisados. Vindo beduinisticamente caminhando pelo caule retorcido e empoeirado, uma formiga, uma formiga. Na paciência milenar de um ser vivo tão frágil assim. Reclamará, à sua maneira, pela posse da flor. Tem quem a ajude.

Não toma sol, a pobre planta falsa. Nunca saberá. Mas ambiciona. Pois que apesar de tudo, está voltada para o céu, súplice, as folhas que lhe adornam servindo de braços em reverência. Sua disposição ao longo da parede branca revela entretanto o sofrimento. Por ser plástica. Por não ser. Não precisa de água, nem de luz, nem do ar. Talvez por isto esteja onde está agora: sendo reconhecida por insetos. Sendo cobiçada por insetos. Antes uma imitação da beleza; hoje uma original do desespero.

Jamais ouvira a palavra jardim. Jamais ouvira. Ou ouvirá. Ou virá a ser.

O hexágono da Dona Aranha Que Subiu Pela Parede move-se no silêncio. A mosca, presa. Agora. Ali. Manifestação mais vívida da vida, asinhas coladas à teia, patas pretas reagindo sem reação. Morrerá de cansaço muito em breve, e se não morrer logo mais a aranha ausente terá voltado e seus muitos olhinhos estarão brilhando de contentamentodiabólico. A traça mal sabe o que está acontecendo, apesar de sua postura atual denotar algum alerta. E a formiga subindo.

A flor, infeliz, sombra iluminada, assiste a tudo na ignorância.
É a vida em si, que ela nunca entenderá.


Brayan Carvalho

Flagra

Caminhão-pipa no céu
chovendo nas mãos do menino.


Brayan Carvalho

Chovia

Estava na rua, olhou o céu, boquiaberto!Deteu-se um pouco em si mesmo! (Parado)
A alma escorrendo pelos dentes, o céu alagando a garganta!

Depois o céu boquiaberto, seco e surdo, empalideceu: andou comedido, com lágrimas nos olhos, pelos timbres da garganta! Tropeçou, fugiu aos berros, empoleirou-se, voltou ao céu (Parado)!

( O homem voltou a andar pela rua, vazio e seco, entrou num beco....chovia!)

Eduardo Martins

Psicologia da Poligamia

Sono. O carinha, encerrado em seu quadrado quarto bicolor, mirava com uma voracidade mórbida a pilha de livros na cômoda. Inalando a solidão na própria mão agora em concha, tentava desvendar alguns poros: olhos da epiderme. E os livros, torreficados, palavra-rejunte-palavra, vivos seres limitados ao retângulo, reluzindo indo indo indo. Ficou decidido: estendeu a mão a um Sthendal e flap! flap! flap!, eis. Noite afora.

Na metade final entediou-se. Não do livro, mas de estar. Lentamente foi desamando, despindo as retinas frágeis e repudiando preguiçosamente a situação. Reempilhotou a amante. Obra. Cobiçou a mão novamente, vendo-se insone - além de ansioso aflito tudo. No meio do meio-dia, a mão em concha na cara carrancuda, chorou no portão. Copiosa, copiadamente. Pois assim fazia com as mulheres. Mas viu-se fêmea efêmera e não pôde se compadecer de si. Embora, soubesse-o-a.


Brayan Carvalho

Desertor

Chegou tarde em casa, sem as chaves. Precisou arrombar a porta para entrar. Riu inseguro da ironia daquilo, pensou no que pensariam dele. Entrando - o ronco rijo e eterno da mãe - bebeu dois goles d'água direto da garrafa azul na geladeira e, sem acender qualquer lâmpada, pegou um disco dos Smiths. Saiu logo loguinho, deixando encostada a porta que à força abrira. A maçaneta, agora inútil e flácida, pendia tosca por ali.

No carro da Lu, beijos pop-art com um quê de melancolia. Play. 10Km/h, 45km/h, 80km/h. Pensou no que pensava que pensariam dele e riu, taquicárdico. Ela cantava junto, e alto. Ele ardia, como assim? O fato é que, hora depois, o carro sozinho - portas abertas sorvendo o abismo - cantarolava a marcha fúnebre das guitarras setentistas.


Brayan Carvalho

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Catarse

Percebi-me sozinho no fim da rua, vendo o tempo correndo e você nua na vitrine do tempo! Há tempo ainda para ser eu mesmo, andando a esmo destro, ao mesmo desconexo tempo de mim mesmo sem nexo correndo nos ares do vento.

Por entre seus cabelos deita-me lento o vento nu do fim dos tempos de antes de eu estar dentro do vazio da rua, sabendo que você, nua, vadia os dias perdidos no tempo. Não me contento com o fim oligárquico das poesias antigas, nas nefastas feridas, dos versos de cárceres castos.

Os poetas velhos e gastos, que não cantam a cicatriz das feridas, mas só o sangue escorrendo de guerra perdida chorando nos braços das musas do velho Parnaso, não correm seus passos pelos rastros do futuro que segue marchando obscuro no silêncio dos tempos: Vanguarda do não ser nada mais que si mesmo prometido como ser que tornará a ser um póstumo tempo.

Por entre o mundo corro como uma rua vazia, não toca-me o dia, não sopra-me o mundo ou mesmo o fecundo traço da pena dos poetas mortos. Caio póstumo nas musas de vidro que tomam-me a mente nua deitada nas curvas do tempo.

Sou apenas penas do tempo apenas.

Eduardo Martins

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Ponteiros

Durante escadarias rolando nuas em pedras de ruas das luas de ontem, quando sou quando inexato de tempo presente rolando ausente das escadarias, das noites e dos dias debruçados em si mesmos fazendo observações à esmo no mesmo sempre mesmo que não tem quando, sou quando apenas é quando sempre uma marcha rente ao quase tempo do relógio andando em marcha de tempo, debruçado nas escadarias rolando nuas sobre as pedras-ruas dos rostos esculpidos nas luas de tempo detento em quando de memória contada, calculada, sangrando aguada depois de rolar as escadas dos relógios de engrenagens pendentes nas novas pastagens do tempo, repetidas e revividas em memórias alagando as vidas dos pastos de emplastos da memória a passo lento de tornar-se memória presente.

Presente, apêndice inexistente inflamando o tempo, ocorrido e recorrente, escorrento gelado e rente pela memória aguada, empurrando -lhe da escada em assassinato indescente, em passo decente de estrela cadente caindo em frente aos pés do tempo. O tempo rente ao choro, de ouro indiferente, conduzindo descrente os passos dos tempos de ouro lembrados em socorro de um presente inflamado, de um apêndice delgado de restos de choro do tempo lamentando a queda em solavanco dos passos da memória partida em esquife vencida, enterrada em ferida escorrendo as horas das pernas do agora, gárgula parada que chora, o choro do tempo.

Se pudesse chorava memória nova, planejava chocar as ovas de bagres perdidos nas profundezas das memórias chorando o tempo suicida correndo em queda livre sobre si mesmo como um eremita fugindo de ser (o) apenas (de) si próprio, perdendo(-se) comum e impróprio no próprio laço que lhe prende o braço ao braço do tempo pendente nos ponteiros do relógio, escravo do correto lógico das engrenagens aguadas das memórias douradas pelo ouro largado sobre o próprio tempo: memórias soterradas de lágrimas duras.

Eduardo Martins

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Hoje em dia

Ao alto, mão vazias seguram o dia claro de asfalto ao meio dia sem idade, o fim certo da puberdade tenra do dia: O dia vestido de dia são as mãos de uma moça ao meio dia correndo sozinha com as pernas surgindo nos vãos do vestido vestido de dia!

No fim do dia, os cabelos macios, o colo de fim de tempo de estar no colo reclamado, conquistado, aturdido nos meus olhos vazios de dias chorados, novos dias herdados do final dos meus dias que começam nos dias que marcham de hoje em diante com os próximos dias!

Chove um dia inteiro num dia inteiro, alagado, correndo escorrido, um dia inteiro chove cheio de um dia inteiro perdido.

Eduardo Martins

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

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Acabou a finalidade: reticências de esperança canceladas diminuem em pleno litígio, ponto final.

O mundo posto em postas não vale mais que um simples prato largado em mesa vazia, alimentando ratos, apodrecendo ao meio dia sem pudores, esponjoso e seco, o mundo em postas não vale apostas nem mesmo no mundo.

Se ponho tudo abaixo, ergo um ego de escombros e entulho, novas ruínas minhas: eu todo sou o mundo e o mundo não vale mais que um prato vazio sem postas de mundo. Redundância das respostas secas: produzir as secas das retinas do mundo: o mundo mudo não muda em nada, salgado à beira de beira de mundo: o fim do mundo não termina nada.

Palavra de poeta: verso quebra sem quebra de página... No mundo, verso engole o mundo, morre, seca e trava as raspas caídas dos versos da boca do mundo! No resto, aposto que o mundo é um pedaço imundo de gente cortada em postas.

Eduardo Martins

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Ver...

Eu não cansei. Na verdade, a verdade é esta: pura, simples, modesta, recostada na parede da minha retina, mole, quase morta, constante, nuca retirada pelas próprias pernas nem pelos braços de outros. A verdade é velha, olha-me com bondade fraudada, mas não deixa de ser verdade, menos ainda de estar na minha retina desgastada de coisas de fora.

Não perco o gosto de vento das alturas de algum ato, comportamento perfeito, asa ilustrada por feito de olhar agudo, deixando mudo os olhares contrários. Se voo nos ares não deixo os olhares cortarem-me as asas de vento puro em muralhas!

Olho com olhos de mar do céu derramando meus olhos em chuvas que choro salgadas de mar de lágrimas de gente arrependida, de ave ferida em céu de mar úmido, salgado, molhando minhas asas com o sal proundo dos mares derramados: os ventos, desalmados, se perdem em exorcisados céus cheios de sal. Bem ou mal, a vida morta no céu conserva-se deitado na grosseria do sal que chove o mar que sorve o céu inteiro.

De escudo apostos, apostando em vitória, choro afogado em mim mesmo, caindo certeiro sobre a minha verdade! Morta, vela-se oposta aos ventos, sobre o veleiro rouco de minha voz ensaiando novos mares! Mares, lares de mim mesmo de mim vazios, do mundo cheios, não reino mares em ares não meus, escorro-me inteiro, sem leme e sem vela, arpoando as costelas dos mares de mim!

Eduardo Martins

sábado, 8 de agosto de 2009

Flanco!

Ao flanco esquerdo dedicaria uma flechada franca! É um presente sincero e mortal, mas é essencialmente um presente, flecha prometida, corrida, de apoio em meus próprios dedos fechados em ferida planejada para mim: solitário destino que eu já vi, agora em cena: encena, acena um sibilo de vento parado na ponta da flecha de cauda de pássaro que em madeira se aninha e se fecha!

Pesa concluir num dia: um dia ainda não concluo nada ainda sabendo que ele é todo um dia voando em entrada de conclusão. Um dia confundo-me em mim mesmo e perco-me do dia. Hoje, que concluí demais, perdi e ganhei muito com ar de homem sábio atrás de barbas de Barrabás das dúvidas, sem dívidas previstas, sem cristo executado! Um dia correu pelas ruas todas e perdeu-se em todas as minhas ruas, mas me encontrou e me disse quem era eu!

Quando concluo, como dizia, sei coisas que dizia sempre e por pouco desacreditei, mas penso que, se não acreditei, errei, e concluo tudo o que dizia! Concluir de verdade só presta para ser o que é quando puxa uma lágrima escondida que pinga aos poucos apenas para as conclusões, mas nunca se esgota (salgada e poliglota) pois são poucas as verdadeiras conclusões! Saber o fim é uma dor rompante em face arredia, antes redimia, hoje oprime o que esvazia o fato: o fim, se sabe, é sempre o mesmo ato que se dá sem fim!

Eu não sei mais nada se te vejo chorar: na tua face cai em gritos miúdos uma solidão que era só minha! Agora, uma flecha sozinha encerra-me o flanco no agora sem destino: destino, no mundo, só mata em ponta de lança em bonança de fé, fora do mundo não mata alguém (matar ninguém é sempre promessa explicada de falso assassino!)

Não consigo controlar uma comoção de me ver brotar nos seus olhos, um disparate sincero que não combina comigo, mas que sou eu! Quando soube que eu era eu, percebi que ser eu era ser apenas não outro que não fosse eu: obrigações que podam as asas das conclusões levem e pesam-lhe sinceridades: afunda-se tudo no fim de mim mesmo: transborda-me o flanco: concluir me deixa sempre muito sozinho comigo!

Eduardo Martins

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Declaração!

Sério, seria melhor ser: ia, se ria e, se Rio não fosse água corrente formando estado decadente, seria tudo mais sério!

Se pudesse alongava o tempo de conversa no aterro de perto de casa em pincelada leve, nas tuas mãos alongada, puxando a brisa leve da breviedade daquele tempo sobrevivemente aos minutos calados, chorando desesperado os tempos enterrados depois do mar que banhava a terra de restelo, agora resto sem morte e sem zelo, enterrados nos lábios do tempo do aterro!

Não sei mais te olhar sem ternura duvidosa de poesia: se fosse você, um dia, fazia você retrato do dia de antes dos dias passados:início assim, recém nascido iniciado em si!

Se fosse noite traidora das decisões derradeiras, abriria as asas da noite inteira e deixaria ser você a noite, cheia de dia em açoites sem agonia da tua pele branca, amanhecida em branca pele de dia!

Eu juro, de verdade, que a verdade é apenas vaidade das penas desta noite de sempre! Às três da manhã, atormenta-me não de tudo e sim de pouco, aos poucos, lembro que não ser você faz da noite morrer em dia! Morro um pouco e de dia amanheço no seu colo vendo ser, quando acordo, que seu colo é sonho de noite em açoite no sólido dia!

Quando você para de ser o dia, o dia não suporto, não me importa mais este tempo de sibilo mudo de enguia: guia-me o mundo este mundo sem guias!

Eduardo Martins

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Cortes

Metade de mim em mim mesmo ainda nega ser metade a outra parte inteira que a primeira vê sobra derradeira da etílica paródia que é metade ser todo sem ser ela toda a vulgar idéia moderna de que algo assim é todo anti-idiossincrático, caótico presságio lógico das lógicas comuns!

Alguns, muito completos, viram objetos descansando em mesas de dia a dia, sem idéias vadias do que é ser realmente, vida demente e receptiva a tudo que não encoste, que não machuque, que não morda e não arraste a pele desnuda para outro embate com o espelho, com o frio derradeiro que de por vir vem sempre antes, em passo médio, remédio distante de toda a discrepância de adultério sorrindo e despindo passado desenhando futuro!

Metade de mim, que é sobra revoltosa, amarra-se em grossa corda umbilical e inegável com a esquerda deplorável e ditadora, percursora de outras lógicas de virar lágrima em apêndice inflamado da não aridez dos seres humanos sem verdades sólidas de ternos bem cortados desfilando naufrágios em gôndolas italianas, em palavras soberanas do vácuo vaticano de toda cristandade de legítimas verdades ilegítimas, presas e datilografadas em gaiola elaborada pela necessidade das crianças sem deus visitando seus medos em repleto desasssossego de serem menos que deus!

Metade ainda, mata-se deploravelmente, por razão ou por vontade de ser gente acima de ser metade e eu, em pobre e burra puberdade de ser, olho este não ser atônito das grandes guerras de dois soldados iguais, de tal forma idênticos, que comem o mesmo pão purulento que o soldo paga soldado em adaga presa na pele de inteiro: Metade é fim derradeiro de outra metade neste golpe fim de siamesessempre, estes gêmeos indecentes da burra gênese humana! Melhor quebrar-se até esquartejar toda metade e impedir a guerra de gente pouca vingativa por ser inteiriça dentro de costela de gente, para sentir o gosto na saliva de ser mais do que metade: uma cria de compassos comparecendo em si mesma sem ser a burrice que esgueira em coletivo!

Metade de mim é ser vencido: eu, em perigo, mato a outra metade!

Eduardo Martins

domingo, 2 de agosto de 2009

- calabocagora -

você já (ven)deu o que tinha que (ven)dar, meu caro importado com as questões políticasafadas atuais, és pingos nos is, acentos nos óis ou palavrão pequeno? príncipe! é a queda mortal da literadura como pedra na janela, nela própria, já, responda ao comando e como ando andando ultimamente afinal? pergunta o generalimentado dos cadáveres colecionados: borboleta ou cachorrinho? se morre Julieta Romeu fica sozinho? pobre rima, rimartelando a mesma fábula de remédio cedido gratuitamentecapto através da lógica pervertida do mundo afora às forras com todo mundo do mundo

é a hora

pessoas reclamam camões abertas pro céu sem paz sobre a terra, pra debaixo dela, pra debaixo dela, quer um bunker? mulheres e crianças em fila falam do fim do mundo o olhar profundo pro fundo do pano profano que cobre o corpo falecido - vivo teria sido um guia, disso todo mundo sabia, está capitulado e existe para estar do nosso lado nos momentos difíceis, vocês sabem

a hora?

contando carneiros antes de dormir se alcança a realidade virtuosa (virtual com saborosa) da paz d'espírito tão panfletada por aí, porra, aí, não há mais assunto nem assento a ser tratado tarde essa hora hoje, precisam todos dormir descansar pra cansar novamente no dia seguinte: siga, indigente, siga indigente pra casa caçando sarna-sarney pra se ridicularizar perante um monte, perante Maomé e a corja-discórdia diz: corja, corja, corda, acorda!

ora!

será tardemais? será cera em demasia nos ouvidos da gente-gentalha todo dia? que morra, canalha! e não cubram resto algum com mortalha:

fora!


Brayan Carvalho

sábado, 1 de agosto de 2009

Da Morte

- Foi uma festa! Você nem imagina, ah mas não imagina mesmo! Pra começar, foi tudo de surpresa: daí você já tira as conclusões. É que ninguém esperava, sabe? Tava todo mundo sossegado cada um no seu canto, fulano na casa da noiva, beltrana corrigindo as provas dos alunos, sicrana fazendo sabe lá Deus o quê (uma desvairada, essa menina) e de repente, um de repente ao quadrado, ao cubo!, e de repente já era. Foi. Nem chamou nem gemeu nem gritou, só... foi. Capaz de não ter nem doído, sei lá. Sei é que num clique tava todo mundo em casa, até gente que não sabia inicialmente do evento, everybody meeesmo! Pessoas entrando e saindo dos quartos, casais, trios, um fuzuê só! Depois teve a água, a limonada, abriram um vinho seco e chamaram mais gente pelo telefone. Não demorou já tinha um bêbado tomando banho nu amparado pela namorada, pra ver se melhorava. Isso tudo porque passava de uma da manhã, agora veja! Aí parou carro na porta da casa, desceu criança, levaram embrulho, povinho bem vestido, Zona Sul do Rio, gente chique, com dinheiro. Por um momento parecia que ia rolar até briga, mas souberam se aguentar. Uma coisa feia, discutindo sem nem saber das coisas... sempre mulher e dinheiro... enfim, você perdeu mesmo, foi marcantérrimo! Vai demorar um tanto pra esquecer, viu? Só quem esteve lá sabe como foi! Vai deixar saudades, ai!


Brayan Carvalho

Parte 0: Parte 1

Cinza o céu, uma borboleta. Dentro da janela o silêncio. Café pronto esfriando na pia da cozinha, frio o mármore, rádio velho ligado chiando no canto oposto uma canção inocente e gaita e a voz bonita crescendo. Sofá da sala ocupado: dormiu lá. Três galos cantam, um depois do outro: um e mais um e um mais. Um grilo, um passarinho, cães, a tosse do bebê, a música que mudou - de repente sinfonia. Em fá, não fajuta, em fá, a quarta das notas, em fá, um arranjo jazzístico.

Primeiro pé no chão frio, dedos envoltos na meia meio velha. Joelho estaal dobrando, estrela no céu lá fora repiscando cada vez mais fraca. Longe o sol surgindonde? O dia começa violinizadamente que o rádio velho chia chia chia... tem nada acontecendo não, pula a hora agora minha senhora, simbora!


Brayan Carvalho

Parágrafo

Nas ondas dos cabelos negros passam todos os navios desespero carregados em fim de noite frustrado em ser início de outro dia! O vento, em agonia, desfaz-se da marola em outros restelos de ventos, para proteger do firmamento o breu dos cabelos tomados de velo de próprios pensamentos sequestrados: firmamentos orados pelos próprios pensamentos fazem com que sejam eles mesmos as colunas mais fortes que o cimento das cidades do mundo, para sustentar o grito profundo agitado nas águas rasas sobre os ossos assobradados de cabelos negros noites em açoites claros de dias!

Eduardo Martins

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Voo quase eu...

Não se pode saber sentimento solto em voo revolto de asa consumada sem ar em escada dos dedos da gente, olhando penitente o risco do vento rasgando o céu: véu do mundo defunto! Ainda me caso com você, mundo dos outros, para ser pros outros um pouco mais de você!

Os dedos se abrem numa liberdade destraída de pedra caindo fatídica em asa de terra parada e, no alto do céu segue o véu das estradas do mundo onde asa é, no fundo, o fundo avesso do não ser asa, o raso rasgo de espada que corta o céu! Abissal sou eu que não vejo teus cabelos amanhecendo céu vermelho em bruma incoerente, fazendo minha alma alada de serpente umidecer-se de não ir e ficando em si: fria pedra de górgona espiã, gárgula vã de garganta parada vendo seu nome vazar por dentro de mim e encher-se de mim inteiro!

Quando você é mais minha, transbordo de você, e sem não vejo mais ser eu por entre meus dedos, debatendo as asas de palavra para sair e dizer querer em toda conjugação possível, em conjunção incrível do distante não ter! Então, o não me toma de assalto e, de mãos postas ao alto, resolvo não correr mais de minhas mãos!

Eduardo Martins

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Confissão!

Não é fácil saber tão rápido a solidez rude e falsa das valsas dos amores antigos de brios e respeitos guardados no peito da gente certa, cheia de cautelas, que têm a carne como sela de si!Se lá na sela não há mais nada que não você, para que trancar-se ?

Coisa de perdão de Deus para Deus: sonhos de flagelos eternos na carne dos homens, coberta pela assexualidade de padres podres de serem gente fingindo gente ser podridão dos padres, dos senhores engravatados carregando bíblias, das brigas vencidas com o diabo inexistente dormindo dormente nas entranhas estranhas das manhas de crianças chorosas, de pessoas idosas que já depuseram Deus que partiu dormindo e seguiu seguindo a crença dos filhos seus, os fariseus da realidade que resmungam boa vontade e secam lágrimas nas barbas esquálidas de Deus!

Não admito não ter fúria de florete antigo e obsoleto em mão de Montecchio traidor quando acho que amor é uma paixão revista, disposta e imprevista de continuar a sangrar-se em dor por um longo tempo, até erguer-se como frumento para a boca dos senhores de si, que, se agora ris, nunca os viu brilhando sozinhos em loucura alevina dos deuses de beira de altar velho, coberto de poeira , falando besteiras com ares gentis de mulheres compradas por fé nas escadas do mundo de triz último a arrebentar-se pelo dente firme, mordendo sublime feito mármore o fim de sepultura em santa figura de fio de velo sagrado dependurado no céu frio!

Se hoje então, pêra e bigode na fronte, corajoso soldado de fronte, em bandeira firme e metálica mato o almado sangue destes fins de fatos internos em gritos eternos nos palcos do bardo barbudo de tempo desnudo em pena de tinta desalmada: discurso de curso de alma interna na voz fraterna da taberna de outra alma! A carne, Bocage, a carne, tu cantas melhor que eu nestas palavras de garganta portuguesa, com a vencida certeza da pureza dos amados filhos do satírico Zeus!

Confesso, ter uma paixão nova e piegas, dos cancioneiros bregas em bordas de portas, em sacadas de casa de outra família não inimiga, mas confesso por amor a verdade dos palcos, que as vezes descarto, para não mofar-se em mim! Estas brigas de mim mesmo têm mais governança de sonho frívolo que bardo esquivo em letras claras e truncadas no inglês das madrugadas dramatúrgicas dos teus pontifícios: república dos patrícios do tempo mundo inteiro!

Para mim tudo é janeiro amanhecido nos olhos dela de novo mundo e, penso estar, certo, não tenho nada mais que o acesso a minhas esperanças patéticas de umas trovas poéticas dos meus escritores defuntos, companheiros aduncos das dobras leves das vogais: grito cais do mundo: soante profundo:consoante de mim: enfim, o fim:

Amanhã escorrem por mim os vinhos doces de promessa em manhã depois da noite de verão de Goodfeallow existente em correria atrás da Hécate corredora e tríplice que nega ser pontíficie destas coisas que os homens criam para negar que, se vadiam, o fazem por alma e não pela bizarra calma dos demônios aflitos em tumbas descritos descansando as mãos em poços fundos: o mundo do bardo é sempre o mundo!

Eduardo Martins

Primeiras expressões...

Escadarias: queda de pedras dia abaixo, abaixo dos meus pés sujos de pedra de estar-se parado muito em si como pedra mirante olhando o horizonte fonte de tudo o que olha parado e nu sobre o céu das intempéries temperos do mundo, sob o céu eterno de mar solar... Florece no teu ombro coisa mais doce que pedra bruta e initerrupta de solicitude dos autos repitidos sob os palcos do teatro...

Não minto as vistas dilatadas fingindo de calmas, subindo as escadas de mim para mergulhar-me profundo passarinhando o mundo dos seus olhos rindo na outra lateral da mesa! Esquerdo à minha poesia nasce sempre um dia em que frente aos outros eu olho tenso com olhar de homem lento sob as óperas da vida, mais corretas e efusivas que as eternas vogais de vozes presas nas óperas de duvidosas belezas das salas de óperas.

Pensei não pensar mais, mas foi impossível, embate-me uma certa sensibilidade insensível rolando louca boca afora em palaavra solta que apavora a palavra presa aos papéis perdidos pelo chão da casa, meu restelo sem asa frente ao mar do mundo! Há na superfície algo mais profundo que o lodo abissal, tingindo o mundo de sagrado sal dos fins de dia á beira de bilheteria do próximo dia!

Pintaria de vermelho alicerce as rosas sofridas em ferimentos de mundo para ver que seus cabelos são sangue de rosas perdidas no mundo de mangue erguido de vida para o fim da vida toda! Toda sempre é gravata de pretérito decomposto! Desposo teus cabelos em vermelho derradeiro esculpido em vento deitado em velas de mares inteiros, em veleiros de fogo destinados aos olhos das antigas igrejas e ventres de casas escuras sem ter a pele branca acesa dos dias das bilheterias do mundo!

Bebendo de um gole só o memomento: as coisas parecem mais justificáveis em brotar teimoso de esperança quase infantil esverdeada! Penso em você da sacada de mim mesmo: atiro-me a esmo para dentro dos seus olhos!

Eduardo Martins

domingo, 26 de julho de 2009

Queda de arlequim!

Dos telhados, um gosto arlequinal pela poesia do choro dos outros nublados, no céu, no mar evaporado inteiro, sobre os cabelos seus acariando meu peito cheio de mar arlequinal trapeziado no céu de agosto com gosto de céu de anil deposto pelo gosto amargo do Rio afogado em tempestade de mar aberto, certo de ser mar amar apenas as ondas pequenas sussurrando nos seus cabelos, transformando meu peito inteiro em mar extremo, mar de remo de tubarões perdidos, tritões vencidos pelo mar dos seus cabelos chovendo tempestades, de incertas verdades que são vagas, nas vagas sem pragas do mar!

Amei-te duas gotas chovendo dos meus olhos de arlequim e chorei a mim mesmo!

Eduardo Martins

Vermelho: a cor upta. Um desfalecimento improvável, um cisne que não canta por agora não, o córrego vivo serpenteado cristalindamente glub-glubeando cenário abaixo. Girassóis sozinhos sob a nuvem cinza, redondamente enganados na vida. A cor escorre correndo pelas cortinas, corta inesperada o coração do cervo. A maçã do peito pra fora do peito pula, serpente está longe, a arte matou o inocente. Anti arte ária éria marte artéria anti-artéria.

Um susto interrompe. Revoada súbita, flap-flap-flapeações muitas preenchendo cavernas e copas de árvores. O sono está morto, o cervo está morto, o rastro é silêncio.

O jardim esconde a rosa sob seu nome próprio. Medo dos julga-mentes e das sen tensas. Manchado o nome de vermelho a noite se pinta cancela o luto refulge septânicamenteadora sobre as cenas. Vermelho aceso na noite, sangue feito foto de relâmpago, procissão mudanônima que não sai de casa. Tic-tac lento, tiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiic-taaaaaaaaaaaaaaaaaac leeeeeeeeeeeeeeeeento, o relógio é mentira e não há tic-tac.

Morrem as linhas inúteis mundanescas com flores traídas, rio que afoga almas serenas, lotta lotta love e cai a estrela pesada sequer boiando. A cor upta ao redor dos olhos, em toda a língua, dentro das unhas. Girassóis parados, murchos, vítimas próximas das criaturas inomináveis.

Dia sem horas, cem horas depois, não há fim não há início.


Brayan Carvalho

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Al(mar)

Antes que água salgado dos teus poros inunde as minhas costelas, minhas mãos e pernas, minha alma por fim, afogando-se louca e sorrindo, no mar de absinto da sua alma, talvez, um eu incerto grite por ajuda como pássaro independente em céu pendente ao mar você!

Homem, almar! Ordeno, mas o mar mudo e obsceno ri-se sarcástico de ser eu naufrágio em seu corpo quente e frágil: colosso vítreo de fim de mundo razoável sem fim! Sei mais de mim quando te mapeio firmamento perdido em meus olhos mareados de mim escorrendo em lágrima com o direito salgado de ser navegada, descendo em meu rosto sem leme ou proa que navegue em boa água de tormenta morta, imitando queda de tempestade proposta pela queda suposta por entre o ar salobre, em palavra: obscuro arremate de cobre puro impedindo os momentos correrem em ventos sorrateiros, estreitos, serpentes de mim.

Escreveria você inteira sobre sua pele para saber como se fere a alma içada em madrugada vadia: poesia amada e almada de tempo.

Homem, almar: no mar só sobra o mar e eu!

Eduardo Martins

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Ad(mito)...

Não se corre assim entre todas as tuas negativas de olhos baixos com a mesma liberdade de pássaro fugido há pouco, de si, de cárcere, de ombro de mártir em cruz sobreposto onde pássaro pousado é guerreiro prostrado em corpo emplumado na cruz sobreposto por outros desejos de deuses em relevos de pássaros mortos.

A verdade é que querer amarra as asas em asas quebradas de gente de olhos baixos, cheios de negativas em certezas ungidas sobre corpos de pássaros mortos, destruídos e ilógicos em fim de lógico de voo, final de apoio justificado aos ares exaltados dos certos de tudo, dos corretos, dos modos enxutos de sangue de pássaro com osso de vento correndo humano o céu nevoento de certas negativas, emplumadas e feridas.

:A verdade é: em seus olhos mais clara: é a verdade: é:

Não se corre assim sobre corpos de sereias mortas, não mudas, estiradas em restelo de janeiros repetidos, de finais oprimidos em haver final apenas neste canto de sereias invejando suas pernas em indescente adultério do existir etéreo apodrecendo nas praias, em bicos de garças e gralhas no finado restelo de todos os janeiros, assombrado e mudo pelo existir profundo de estar-se sempre.

Eduardo Martins

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Há mares

Não vejo mais pessoas na beira da escada olhando nos céus você asteada em luz de entrada de dia absinto, em rigor de traje sucinto por ser apenas motivo de tudo ser cerimônia de alta classe em auto de si mesma forjado em torpor absurdo de crítico surdo olhando a acústica rústica de um vitral!

Não desconsiderem um poeta: corre solto sobre passos embriagados das paredes que separam os estados da mente aguçada do bom economista, do advogado, do autodidata nascido sabendo em presunção obscena de homem lógico, por sobre ponteiro de relógio de estudo de tempo, de explicar firmamento escorregando em chuva de fim de dia. Não desconsiderem estes pobres que bebem a goles o mundo inteiro porque não sabem ser inteiros contidos em corpo nascido para futuro defunto.

Não sei mais se vivo sem cúmulos de ter-te chovendo em minha pele inteira, em toda beira de mim mesmo, para ver se vejo que por mim a água passa, angelical, caída e escassa quando vê que nada nela se pretende mais que estrela luzente expulsa da regra alta do paraíso, pros males dos soltícios do tempo ou para outro mares: Há mares que, se amares, não perdem-se de todos como salobros pecados ao fim!

Há mares salobros de queda fria em agonia de estrela caída em fim de dia, na chuva vésper, lavando as escadarias douradas do alto das torres gagas em repetir eternas amares e guerras de velhos tempos com o firmamento como testemunha que escorre para alcunha de mares em haver de corrente de lágrima que não sente a queda que a envereda em pura sede de garganta náufraga de paraíso divino, bebendo em desatino o sal destas águas que brotam em suores da sua pele, que enxáguam e ferem meus olhos para virarem-se em lágrimas de páginas de mares subalternos de poetas de mares onde há mares além...

Eduardo Martins

sábado, 18 de julho de 2009

Valete, Dama, Rei

Não mais quis perder o rosto nos rostos vazios de si na vida das ruas unidas, das avenidas verdadeiras de marchas firmes e rotas de outras marchas, afogadas à força nas chuvas de março, repetidas assassinas sem tempo, sem álibi para não estarem suicidas e chorosas viúvas de rosas amarradas ao chão sem ventos.

Abençoado Rei de Espadas, das cruzadas de mim mesmo, não o sei mais se vejo minha glória desposada por sua derrota em queda fria de guerra morta nos meus braços e eu, de braços dados com a intocada rainha, sabendo ser minha a guerra apenas: filha morta sem padrinhos, caindo em sono surdo de coma induzida pelos dias sem vida das mortes sãs!

Não foram passos afogados que pisaram em mim para entregarem meu brasão encarnado por entre as costelas, por entre sequelas em vigília armada para guardarem-me de mim. Foi a mão firme da tua virgem coroada e nua, jorrando da boca um março afogado pelas minhas veias de sereias goles, bebendo disformes as paredes de meu sangue, por entre março passado, aguado de tempo.

Cobriu-me um firmamento vestido de queda de anjo perdido em bramido de Deus. No chão um vento estranho caiu à procura de luzes elétricas sozinhas em pontas de ruas santas e crucificadas , não sobraram mais cantos de vozes femininas para queimar em parafinas os próprios cabelos, os desesperos de sereias nuas, caídas nas ruas, arruinadas de desejo, sem respiração de chuva, sem comer as uvas de Deus bramido na boca absorta em asas de anjos caídos nos punhais da Casa Real de Espadas: proteção das estradas de um março perdido em contagotas de dias caídos entre as minhas costelas.

Eduardo Martins

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Lirismo de fim de dia-a-dia

Decidi lançar-me aos leões do mundo que lambiam-me as mãos dedicados, para ser apenas deles o alimento lançado pelos imperadores queimados nas lágrimas de suas viúvas de olhos rasos, rasurados de dias passados em dias mais claros dos outros tempos oxidados em seus olhos já cegos pelos olhos de seus imperadores.

Ser eu apenas nas bocas roucas dos leões queimados pelas lágrimas de uma noite com um resto de lirismo enfático e calado, poético, trepado em saltos altos, em um camarote no alto de mim, assistindo o sem fim de mim mesmo que outros disseram e contaram entre os meus cadáveres queimados nas bocas de fogo chorado das feras. O número de guerras pela posse de mim em minha coroa lavada dos olhos razos da minha imperatriz perdida em malas de gente sofrida andando nas lambidas do fogo pelas ruas de feras domadas em esfera de ex-feras encerradas, brilhando queimadas pra morte da noite sem fim!

Chorar um dia é uma grande saudade vazando em passagem por dentro de si. Se eu tivesse, e não tenho, um pouco de lirismo de águas salgadas choraria o canto estranho das arenas onde minhas mãos largadas recebem perdidas as lambidas de leões medrosos, de deusas honrosas das labaredas de mim, dedicaria a ti: musa apenas da minha queda fingida de pássaro morto, absorto em flâmulas, em antigas tâmaras de ouro puro parido pelas ruas incendiodiárias de engolirem-se a si em suor de águas salgadas de lirismos estradas que não levam a mim!

Eduardo (Mar)tins

terça-feira, 14 de julho de 2009

Bordas

Quando toco as pontas dos pés nos olhos frios, os olhos fios de uma alma enforcada e tendenciosa, estremeço todo minha proximidade escorrida pela pele molhada antes por água salobra transbordada da forca de mim em mim dependurada.

:estranha-se a si mesmo todo dia ao acordar e voltar a si depois de ser outro voltado a si quando estava na pele do mundo defunto em mim mesmo: Não sou mais primeira pessoa de mim, sou antes segunda denunciada e trancafiada dentro de si: é o não eu definido em eu apenas.

Eu : agora : nunca : apenas : eu

Megulhado en(m)fim nos olhos, agarro-me à borda, aborda-me o mundo e a borda do profundo mundo sou eu agarrado na borda dos olhos do mundo tendencioso em eussendo, afogo-me pendende na borda!


Eduardo Martins

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Logo:

Eu: Nada.
Você: O que é?
Eu: Não sei.
Você: Sabe que eu também?
Eu: Tô cansado de repetir infinitesimalmente a mesma operação.
Você: Será que tá me ouvindo?
Eu: Não sei até onde vamos agora chegamos.
Você: Tentando me salvar?
Eu: Vou dizer que você não sabe que eu disse isso.
Você: Pergunta como terminar.
Eu: Secando as mãos depois de lavá-las antes de comer.
Você: Alheia a tudo, perdida sem sair do lugar.
Eu: Poema?
Você: Se tem verso, então...
Eu: Qual a frente?
Você: A gente?
Eu: Não.
Você: Muda de assunto.
Eu: Vou tentar com.
Você: Ajuda?
Eu: Queria.
Você: A minha?
Eu: Sempre.
Você: Mas e agora?
Eu: Deixa.
Você: Vai embora.
Eu: Fica.
Você: Não sabe.
Eu: Sei.
Você: Faz silêncio.
Eu:
Você:
Eu: Tá bom?
Você:
Eu: Você?
Você:
Eu:
Você: Sabe?
Eu: Não.
Você:
Eu: Sabe?
Você: Sim.
Eu: Chega, né?
Você: Começa daqui.



Brayan Carvalho

domingo, 12 de julho de 2009

Caixa (Ser)nica

Será que ainda me vejo naquela penumbra vazia dos cantos dos holofotes vermelhos do sangue dos homens mortos nos corpos dos atores andando descalços de provas de serem eles apenas gente que guarda o sangue de gente viva sempre no sangue repetido da gente dos palcos?

Não sei, ando muito calcificado em ossos meus apenas, sem juras, sem ser duvidoso em não ser impossível. É mais íngreme pisar o solo de si, pular o vão (tão nós) das costelas sem o sabor sórdido dos ossos dos outros, arquitetônicos e iguais, de cantos segredados, segregados dos olhos de fora.

Sei-me demais para me negar e para fugir de mim, já que sempre me encontro no mesmo lugar euparadoemim.

Ainda ando em passos vazios nos passos dos meus espaços com outros passos que não são meus com um laço vil de mim comigo, apertado, rompendo e possível de ser apenas um traste no chão dos palcos vazios onde vejo morrer homens de sangue sempre fora das veias do sangue dos outros homens que saem dos palcos para serem o mesmo impensado mesmo de sempre.

Choro na platéia minha impossibilidade de matar-me um pouco!


Eduardo Martins

sábado, 11 de julho de 2009

Meia (noite) 7/8

Meia-noite, ainda meia, porque se é noite inteira está completa a manhã, amanhã verdeiro que, com noite na beira, segue afora vão e derradeiro da noite, que no copo era meia dose de dia e cheia seria hora de noite inteira, derradeira, suspirante, mas sã!

Meia-noite calçada nas pernas de minhas mulheres com 7/8 de sonhos completos, mas meus: vermelhos e obscenos , largados em queda de escada na escalada para sacadas dos sonhos de minhas mulheres não minhas, minhasmulheresninguénsdetodos!

Fico indeciso de ser eu quando vejo as lágrimas caindo, serenando o mundo de escuro profundo, dos olhos das mulheres nas ruas, das mulheres nuas de folhetins vazios, de desejos gentios, de gentis quereres delas de serem elas para outros como eu: outros euminguémdetodos, outros sucessos medalhistas pendurados nos pescoços nus das mulheres pregadas em paredes de rígido ser vestido de ter um não coroado!

Quando acordo das sacadas, sacadas as armas da cintura delas, todas elas caídas no chão do meu quarto, sou apenas eu sem saber quem sou! Olho nos espelho assustado por ver-me gente e saber ser eu gente que dormiu comigo e deixou cheiro nos meus lençóis, pele na minha pele. Sou pessoa encubada no meu hálito de estrada perdida no escuro do céu da boca, na garganta iludida e sem palavras de gente, muda de gente de verdade!


Eduardo Martins

Crônica do homem de repente

Num clique ele pediu "fique" e ela esticou os braços para além onde ninguém estava. Lava quente de vulcão era sua mão rente ao rosto dela, nunca aprendendo a ser o que se espera. Era fome de alma, longe do corpo, hirto na falsa calma de alguém que está além dos outros. Poucos segundos bastavam para ela, chuva de Cinderelas brancas como neve leves como pluma uma a uma caindo alegremente pois as fadas estão ausentes.

Afogando mágoas de águas passadas em montanhas que conheceram Maomé, ele ficou de pé e ali pensou em agir final-felizmente mostrando dentes amarelos pro mundo inteiro, que num segundo e meio o reconhecia como aquele que não sabia sorrir tampouco fazer. Verdade é que ele não conhecia nada além de tudo, e mudo só lhe restava indefinir-se como disse ela à sua frente parada entediada com o impasse não-passante.

Stop: estopim aceso.
Decisão de todos esses: hão.

Queria ele chorar mas não sabia o que fazer depois de a lágrima rolar e cristalina resplandecer descendo rosto afora indo embora da sua vida caindo finita tocando o chão oh não tragédia demais pra este pobre rapaz que só quer ficar com ela, sem prazo sem parcela, só quer estar com ela e fazer do repente uma constante. Chove sem aviso no meio da rua a amada nua fria num deslize cai sozinha sem ter quem a segure agora ele foi embora indeciso pensativo cabisbaixo reticente: o homem de repente.



Brayan Carvalho

Cabeceira

O Lord, as pessoas morrerão de identificação imediata com a história do homem da bala de prata que, baleado, foi perseguido e depois executado sem saber o porquê. O Lord, as pessoas vão querer uma parte de seu corpo pra colocar de souvenir, vão querer exibir, mergulhar num copo e com formol conservar o mártir que, morto, só faz parte da ideia. O Lord, essa história já é tão velha que de rugas e problemas é maior que as dores e penas sentidas em nome desse homem que, vivo, não passou de um exemplo: gene recessivo. O Lord, as pessoas estão cansadas de ouvir a mesma ladainha, todas elas mesquinhas querem torcer o fígado e anestesiar a ignorância, as pessoas leem como quem está de cama, a história dele não chama a atenção - mas todo mundo o ama.

O Lord quem é este isto cisco no meu olho?
Lhama mascando minha parte boa assim leviana?



Brayan Carvalho

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Pernilongo

Nas quinas escuras dos bairros estão amarelas e trêmulas memórias escondidas dos homens das praças e esquinas, debruçados nos muros ou sentados nos bancos de cimento duro como os rostos dos homens fazendo cimento para vestir os muros das paredes do bairro, e prender lembranças, e esconder os carros, as antigas árvores, os prédios tombados por memória, eternos de glória tombada ao chão.



História: consoante muda, miúda e bem enfeitada por cortes de veludo europeu desarrumado por penilongos de mangues pútridos, esses nascedouros, dos vindouros futuros de esquinas de homens parados com caras fechadas por cimento duro, concretos e obscuros, no claro das paredes dos prédios caros, erguidos e solitários, vidrados em cimento duro do rosto dos homensdeumsódestinolargado.



Marcham metrificados em procissão de revolta, humanidade que volta sem ser menos roedor de extremos de si para ser menos roedor, e, depois, acalmam, dormem, abrandam, afanam heroicos um perdão contratado por um pouco de barulho.



A justiça é cega pelos dedos dos homens de pouca cegueira de ser o resto. As memórias sussurram nos cantos obscuros dos jornais de domingo do ano passado, nas represas de reprises, escondidas con cantos obscuros do nascedouro de (indi)gentes apoiados pelos muros bêbados, de pedra pura, sem arremate metódico de memórias deles.

Eduardo Martins

Telha do(i)s

Se ela ainda andasse nua pelos telhados das minhas casas construídas, cenográficas, perdidas, pornográficas, caladas nas ruas dormentes de sempre ser ruas, carregadas de gentes correndo em horas mortas, revivas, repostas em um mesmo lugar das ruas, das casas nuas em meus telhados de horas mortas, revivas e postas nela nua, resposta reposta para as fatias de horas mortas que chamamos de dias.

S(´)e(ria) a verdade das coisas de hoje, dependuradas nela, sempre razoáveis e vazias à luz de um dia velado por dias passados, repetidos e gratos de ser novo dia, de útero esquife perdido na terra da guerra ganha dos tempos sem ela, janela dos tempos: meus olhos nos dela.

Partiu um dia, o dia inteiro, em pedaços idos, findos, perdidos em passos de pés amputados que levam urna sagrada da vida sangrada dos dias dela. Sem ela há dias senis e mudos, encostados em canto de paredes de casas que nos telhados têm ela nua, rua dos dias de outros dias mais heroicos de passos dela nua nas ruas dos dias em telhados de casas perdidas.

Corajosa, bailarina pisante de arranhacéus: pernas viventes de mundo defunto de plano de vida perdida na ferida de dia partido em alarido breve dos leves suspiros de outros dias sem ela.

É certo que: cada passo balaço de chuva na tela de telhas dantescas do alto do mundo

Seria você: Um sopro de livros, assassino vencido, suspirando e empurrando os tijolos dos muros

E: certa de ser você nas mãos abraçadas nas minhas mãos frias

Correria: vadia canoagem de pele plumagem de ave perdida

Até o telhado: Tablado do dia



Eduardo Martins

Cinemacidental

De vagar devagar, virou fantasma.
Assim, sem menos nem mais ou menos nem mais. História pouca, vida parca. Passou despercebido, sequer foi ouvido como pernilongo-vampiro à noite à espreita à meia-luz à meia-noite. Hora dramática, vertiginosa, clímax sem gozo dele porque o rolo de filme acabou na sala de projeção e ainda muito faltava para saber quem era o assassino. Mas era o mordomo, dono do mundo. Háh! Parecia piada.

Fantasmizado, decidiu ir contra todas as paredes. Era sua chance de encontrar quem sabe não se sabe o quê. E de não saber o que se pode encontrar (principalmente quando se é fantasma), chega ao fim. Sim, a história. Começa ali, acaba aqui. Um barbante estendido sobre uma fogueira, que vai cedendo aos poucos, partindo suas fibras numa dança hipnótica e constante. Até que.

Foi bom pra você? Perguntou Deus a ele na mesa do bar àquela hora da manhã do dia seguinte ao fim da filmagem do que não é captado - ele. Making of pra sempre. Vida moderna, é o Grande Irmão em seu abraço receptivo: junte-se a nós e terás mais nós, essa é a mensagem que ninguém entendeu ainda. Só ele. Não Ele, só ele mesmo.

A vida é um doce que ninguém compra. Veio a primeira mosca, voou voou voou ao redor, p-o-u-s-o-u na pausa habitual e esfregou as patinhas miudicíssimas pensando agora é o momento de desfrutar. Coitada. Provou, não gostou, levantou voo novamente e desbaratada (numa clara traição involuntária à sua natureza) foi morrer em menos de 24 horas. Há uma obediência, percebe?

Quando a menina acordou no dia seguinte, ninguém a observava. Imaginou que com isso já estivesse melhor, que a febre teria passado e que a mãe o pai quem quer que seja estavam dormindo ou recompondo os ânimos gastos na noite difícil-anterior. Saiu da cama com os pés nus, os olhos semicerrados e nas pisadinhas leve sobre o chão frio ela foi andando assim: _ _ _ _ _ _ _ e chegou na sala. A cena que ali se apresentava era um verdadeiro teatro dos horrores. Que cena era? Só a menina viu a mosca morta virando fantasma do outro lado da rua através da janela aberta em manhã de Sábado (!) porque alguma coisa aconteceria sem aviso e, sem aviso, o mordomo veio da cozinha. Era o tal do fim do filme do. À Ele.



Brayan Carvalho

quinta-feira, 9 de julho de 2009

,eu,

Apêndices do sono: eu na frente do espelho, a manhã na frente da janela, branca e cega e leve e muda! Eu calado, ainda, por enquanto, apenas, passando uns poucos minutos sobrevivendo a um silêncio que nas ruas lá debaixo do prédio se perde em burburinho disléxico e absurdo, repleto de casos de ontem, de saudades de passados repetidos à conta gotas, nas veias do mundo, um anestésico firme para olhos trêmulos por cima dos ombros ossudos dos velhos largados em calçadas, empregos duvidodos de existências desistidas.

Olho para a barba espaçada no espelho, a certeza vem das mãos passantes leves como febres de dias recém vindos, está na hora de escanhoar o queixo para ser descente para as pessoas das ruas para as mulheres principalmente, para calar o silêncio no cochicho profundo e acanhado de crescido nas bocas dos bueiros de gente nas ruas, invasivas diárias de si, como ratos roendo por dentro os ratos.

Tremo com a lâmina perto dos lábios: ou mato a máscara largada de dias, ou morro da revolta da algoz beijando meu pescoço, fria e assassina, são opções e exageros. Coragem, deixo ser machado a mão lívida da idéia para vestir o capuz da praticidade. Luzes acesas, muito cirúrgicas e brancas nos ladrilhos do banheiro, sem mais exageros, a face escanhoa um pouco mais bruta que antes e penso em parar com medo de ver diferente o rosto há tempos largado à contagem do tempo natural de um rosto qualquer, sem muita seriedade ainda, sem nenhuma seriedade ainda. Ainda, nada demais, nunca demais.

Muito pouco tempo para ter mudado o abrigo dos olhos tristes, que me disseram que eu tinha pregado na cara de criança com ares de séria! Nada ainda, não mais que isso, mais talvez nunca, já mais que jamais tive: postura de olhar voltado para dentro em afogamento sem desespero!

Resolvi esperar, resignado e enganado, acontecer alguma coisa que mudasse: Muda de si mesmo nascendo nas barbas, nos cabelos, tornando o corpo inteiro uma coisa menos morredoura que a expressão de garoto cancelado pelos livros, mortos dissecados em minhas prateleiras!

Resvala do meu rosto um pouco de sangue, meu e da lâmina, agora mais corada e menos digna das musas doentias que imitava, e ela, num arroubo de mulher sem vícios de virtudes, beija-me envergonhada e corre-me no lábio o gosto do sangue do lábio que a boca não sentiria.

Estranho não saber do que /s/t/e pertence!


Eduardo Martins

Doze anos

Desde os doze anos, não gosto muito de mim! Foi meu ano iscariotes que, já sem calos por pairar com os pés ao ar, caminhou por martírio de mãos dadas com outros santos até meu dezessete e foi coroado imperador de si, muito temente a (D/d)e(u)(us)(le).

D,eu,s de meus doze anos, austero e firme e pai e hóstia, segurava a corda de meus 365 passos iscariotes, poeirentos, que fez deles areia no fim dos meus doze anos!

Minha idade paralítica era traidora de si em conquistas como é até hoje, e eu contava em terços a verdade barbuda e firme de ser um traidor sincero, não muito sensato, segurando os pés de D,eu,s para que não virassem areia.

Na areia há pegadas em mim até três terços completos e divinos sobre meus ombros, com o peso da glória.

Não se afirma retidão transbordada nas areias traidoras que beijam os destinos das águas que sobem aos céus quando estas se empoçam paradas, sem virar sangue de Nilo, sem tornar casa de sapo, bolha de pele, anjo divino caindo dos ares em busca de sangue do rio do Egito esquecido de manchar as portas dos homens discordantes e traidores, parados em sal puro, sal da terra da gente que pisa minhas costas do Egito, dos mares vermelhos do sangue do Egito.

Pela manhã (D)eu(s) era (D)eu(s) ainda e não sei se sou agora mais que areia olhando oratórios salgados, dos homens parados, nas cadeiras dos berros das palavras do centro da cidade que, na minha idade, ainda é o centro do mundo.

Ainda ampulheta pura, com certeza de cair areia atravessada em areia polida e brilhante, transparente eu messias de mim comigo fagocitado, impuro, ilógico, demonológico derramando seco de um lado para outro do meu sacro corpo.

Um dia caio fixo em queda livre do m(eu) D(eus) titânico em cima de mim pisado por mim, correndo do vidro de mim vencido, m(eu), vidro quebrado, seráfico, quebrado, dos olhos de D(eu)s...


(E)d(u)ardo Martins

Uma mulher

Uma mulher foi encontrada morta, mas já era morta antes, no induto das saias de parideira cancelada. Uma mulher apenas morreu e nisso reside o fato (fato é sempre pretérito, é fato, mesmo quando estende mãos firmes e amarelas para afanar os relógios de parede e declarar, bom saudoso passadista, que o tempo é dele nas bocas dos outros que contam pretéritos amarelados desconjurando o presente por fatos, todos adoram fatos!)

É verdade que era uma mulher apenas, ou menos, quando trepada a boca nua desgostosa nos bigodes nada sutis de um marido muito forte e distinto, e correto para ela e para outras mulheres afogadas nas poças das ruas recentes das dezoito horas, quase nuas em dívidas pagas pelos bigodes sorridentes e fixos.

Uma mulher foi encontrada morta, porque estava em casa, engarrafada, não como as 18 horas, alcóolicas e perfumadas, cheias de liberdades engradadas, evaporatórias para dentro das janelas das casas, sumidas para sempre.

Algumas pessoas choraram, depois flores e rezas, e orações e mais choros. Ele a amava tanto que resolveu, com certezas definitivas, que era melhor sofrer agora, enquanto era um homem forte e pagava suas dívidas com as esquinas das ruas no fim do emprego expediente de sempre, o dia da vida dele repetida sempre, sempre fato descontado dia a dia de seu bolso vazio de fim de mês onde, neste mês, estava uma faca! Todos adoram fatos, e este era um fato cortante, coeso demais, presente de casamento de uma velha senhora há muito tempo encontrada morta.

Eduardo Martins

Das Residências

Sair de casa e atravessar a rua e atravessando a rua entrar no carro. Objetivos diários. Ponteiro tic-tac-tic do relógio na parede do quarto vazio, ninguém dorme lá mas há um relógio. Cronometrando a inércia. A casa nunca acorda de verdade, a casa é o silêncio que se faz depois que um assunto acaba - e a vida é um assunto do qual não se argumenta. A vida é sair de casa e atravessar a rua e atravessando a rua entrar no carro. Aliás, este carro vive mais do que a casa. O nome já induz: este carro há de carregar pelo mundo afora. A casa morre na impotência de um animal invertebrado.

A pia da cozinha vive seca. O mármore desidratado vira cimento, chapisco de muro, arte bruta. Estala a geladeira e a estante na sala oscila. Tudo reverbera e a tinta das paredes escurece quinzenalmente, o ar não corre pelo corredor que liga os cômodos - tragicomicamente incômodos. A casa não pode atravessar a rua e atravessando a rua entrar num carro. A casa não vive, não sabe do mundo. Nunca verá o mar, nunca subirá uma ladeira, nunca sairá em fins de semana para trocar ideias num bar com os amigos. Amigos que existem, mas que ela não conhece. A casa está proibida de sair do quintal.

A casa nunca ouviu falar de casamento. Sorte a dela, pois implodiria muda de felicidade mórbida se soubesse. Casa que é casa não se casa. Perecer: parece que esse é o futuro dela. Nunca aparecer num telejornal, mesmo que seja passando no fundo da cena. Atravessar a rua e atravessando a rua entrar na casa: jamais! Ficará na espera eterna, de janelas fechadas e tic-tac-tic do relógio na parede do quarto vazio. Cronometrando a inércia.

Objetivos? Diários? Casas não podem.


Brayan Carvalho

Mas

nós não somos o que nascemos e a evolução depende dependurada na parede do fundo quebrada com janela pra fora da alma armada-e-apontada para o centro do espelho pois nossos pais e avós só apontam o mesmo ângulo do equilátero tornando tudo igualmente o mesmo plano de fundo artificial em tela de efeito imediato com doses homeopáticas de homo-sapiens-celibatus

é rudimentar meu caro Holmes a pedra-pomes e o pomo de Adão ah não de novo o ovo e a galinha ó frustração nas quatro rodas deste carro alegórico grande demais para a avenida e pequeno demais para a vida

o anel do retorno eterno volta revolta voltando Voltaire observando dizendo que escreve-nos uma longa carta por não ter tempo de a escrever breve

cabe neste bolso uma gota de sangue do pescoço da moça e antes que alguém se zangue vale a pena explicar por a+b a natureza dos seres da luz e daqueles que os olhos desviam da cruz por já sofrerem demais com a eternidade que não acaba assim como as cidades um dia serão soterradas e novos pés de novas sociedades assentarão suas águas paradas

tira-se como conclusão uma rima nada prima:
ser ou não ser ou ser o não?
eis a questão

overdose: this dose is over.


Brayan Carvalho

Alto!, falantes!

Olha, eu vou falar do fim do mundo mas não se espantem vocês porque inevitavelmente eu chegaria a este ponto. Vou falar do fim do mundo e vocês precisam me ouvir porque não se sabe quando é que teremos outro acontecimento deste, então desliguem-se-liguem-se agora e vamos todos dar as mãos e ouvir pacientes e concentrados A Voz Que Tudo Diz sair do mais profundo fundo do poço mais antigo de toda a história da humanidade.

(história apocalíptica é assim mesmo)
(tudo remete a uma megalomaníaca tensão)

Todos nós aqui agora juntos? Sim. Todos concentrados? ... Ótimo! Podemos começar? Uhm-hm! Chamo a atenção de todos vocês agora, e da mesma forma espero que vocês saibam chamar a atenção de outros alguéns próximos, de modo que possamos fazer aquela enorme corrente de corações em acordo voltados para um único ponto - tudo ao mesmo tempo, bem ao estilo Hollywood de viver a vida. Algum de vocês sabe tocar violino? Seria interessante uma música incidental agora.

Prestenção: como eu disse anteriormente, falarei do fim do mundo. Fim este que está próximo, oh sim, ele chegará tão logo as senhoras e os senhores pisquem os olhos. Não que piscar os olhos agora esteja proibido, piscar os olhos não representa um risco real de trazer o fim do mundo, vocês podem piscar os olhos à vontade, entendem? Foi apenas um modo de dizer... é metáfora o nome disso? Enfim, o fato é que fui escolhido para falar a todos sobre este evento de que se têm comentado há muito tempo e que, para a felicidade de muitos, está chegando. Eu sei, eu sei, demorou bastante mesmo. Dava para o mundo acabar de tanto que as especulações duraram.

Dizem que o mundo já veio ao mundo se acabando. A ciência diz o seguinte: é o seguinte: não sabemos. E, senhoras e senhores, se a ci-ên-cia não sabe explicar, então... olha, não sei explicar também não. Voltemos ao assunto anterior: fim do mundo vindo aí e junto com ele a primavera, estação das flores e da fertilidade, todo mundo se amando em meio aos aromas naturais, Woodstock e aquela coisa toda, bla bla bla. A recomendação que recebi - e que agora repasso aos aqui presentes - é: não fazer nada. Nada, nada mesmo. Sabem por quê? Porque é perigoso fazer alguma coisa. Afinal de contas estamos falando de um assunto sério, e assuntos sérios de verdade exigem dos envolvidos um alto nível de descompromisso - Darwin explica.

Estamos no fim - do discurso, não do mundo ainda. E como encerramento, gostaria de deixar nas mãos de todos vocês essa responsabilidade, que de tão mencionada e transferida a diferentes portadores já tornou-se facilmente suportável e consideravelmente menos responsável. Ou seja: é a importância de um cargo acima da prática que o envolve. Uma rara oportunidade, não é? Sei o quão importante isto pode se tornar perante ouvidos e olhos que nos coadjuvam nesta história (se é que me entendem), mas não se incomodem demais porque agir não é obrigatório e ouvir-e-ver é inevitável. Cabe a nós não permitir a morte deste ideal, desta relação tão bonita que estamos construindo com a civilização.

Um muito obrigado! Agora voltemos todos a nossas vidas comuns cheias de camadas multicoloridas e saibamos incorporar à elas os ensinamentos desta noite, d'A Voz Que Tudo Diz. Porque Deus ainda está no banheiro.


Brayan Carvalho