Jaz na parede a flor. Branca, plástica, seu fino e rugoso caule contorcido e suspenso como que por uma ausência de gravidade naquele ponto específico. Jaz na poeira, a flor. Uma traça traça planos ao seu redor. Quer casa, ainda que temporária. A algumas pétalas de distância, uma aranha já deu forma a um hexágono impreciso, rede improvisada para turistas desavisados. Vindo beduinisticamente caminhando pelo caule retorcido e empoeirado, uma formiga, uma formiga. Na paciência milenar de um ser vivo tão frágil assim. Reclamará, à sua maneira, pela posse da flor. Tem quem a ajude.
Não toma sol, a pobre planta falsa. Nunca saberá. Mas ambiciona. Pois que apesar de tudo, está voltada para o céu, súplice, as folhas que lhe adornam servindo de braços em reverência. Sua disposição ao longo da parede branca revela entretanto o sofrimento. Por ser plástica. Por não ser. Não precisa de água, nem de luz, nem do ar. Talvez por isto esteja onde está agora: sendo reconhecida por insetos. Sendo cobiçada por insetos. Antes uma imitação da beleza; hoje uma original do desespero.
Jamais ouvira a palavra jardim. Jamais ouvira. Ou ouvirá. Ou virá a ser.
O hexágono da Dona Aranha Que Subiu Pela Parede move-se no silêncio. A mosca, presa. Agora. Ali. Manifestação mais vívida da vida, asinhas coladas à teia, patas pretas reagindo sem reação. Morrerá de cansaço muito em breve, e se não morrer logo mais a aranha ausente terá voltado e seus muitos olhinhos estarão brilhando de contentamentodiabólico. A traça mal sabe o que está acontecendo, apesar de sua postura atual denotar algum alerta. E a formiga subindo.
A flor, infeliz, sombra iluminada, assiste a tudo na ignorância.
É a vida em si, que ela nunca entenderá.
Brayan Carvalho
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
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Nem sei o que dizer Brayan.
ResponderExcluirTexto maravilhoso,um convite mesmo a mergulhar em tudo que acontece nele,embora pequeno é de uma verdade e intensidade sem igual.
Grande beijo.