quinta-feira, 9 de julho de 2009

Uma mulher

Uma mulher foi encontrada morta, mas já era morta antes, no induto das saias de parideira cancelada. Uma mulher apenas morreu e nisso reside o fato (fato é sempre pretérito, é fato, mesmo quando estende mãos firmes e amarelas para afanar os relógios de parede e declarar, bom saudoso passadista, que o tempo é dele nas bocas dos outros que contam pretéritos amarelados desconjurando o presente por fatos, todos adoram fatos!)

É verdade que era uma mulher apenas, ou menos, quando trepada a boca nua desgostosa nos bigodes nada sutis de um marido muito forte e distinto, e correto para ela e para outras mulheres afogadas nas poças das ruas recentes das dezoito horas, quase nuas em dívidas pagas pelos bigodes sorridentes e fixos.

Uma mulher foi encontrada morta, porque estava em casa, engarrafada, não como as 18 horas, alcóolicas e perfumadas, cheias de liberdades engradadas, evaporatórias para dentro das janelas das casas, sumidas para sempre.

Algumas pessoas choraram, depois flores e rezas, e orações e mais choros. Ele a amava tanto que resolveu, com certezas definitivas, que era melhor sofrer agora, enquanto era um homem forte e pagava suas dívidas com as esquinas das ruas no fim do emprego expediente de sempre, o dia da vida dele repetida sempre, sempre fato descontado dia a dia de seu bolso vazio de fim de mês onde, neste mês, estava uma faca! Todos adoram fatos, e este era um fato cortante, coeso demais, presente de casamento de uma velha senhora há muito tempo encontrada morta.

Eduardo Martins

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